Penhora em dívida não alimentar
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Penhora em dívida não alimentar

Fala, pessoal, tudo certo? Hoje faremos uma breve análise sobre a penhora em dívida não alimentar, destacando, ainda, o entendimento do Superior Tribunal de Justiça (STJ) sobre o tema.

Desse modo, teceremos algumas considerações iniciais sobre a previsão constitucional e legal da penhora e das dívidas de caráter alimentar.

Na sequência, falaremos sobre os pressupostos básicos para que se proceda à penhora, bem como quais são os bens e os valores impenhoráveis e inalienáveis, de acordo com o Código de Processo Civil de 2015.

Por fim, abordaremos a questão central deste artigo, qual seja, a possibilidade de penhora tanto em dívida de caráter alimentar quanto naquelas que não possuem natureza alimentar.

Vamos ao que interessa!

De início, aponta-se que a Constituição Federal (CF/88) prevê, de modo passageiro, tanto a penhora quanto os créditos de natureza alimentar. Contudo, não os relaciona diretamente.

Por exemplo, o inciso XXVI do artigo 5º da CF preconiza que a pequena propriedade rural, assim definida em lei, desde que trabalhada pela família, não será objeto de penhora para pagamento de débitos decorrentes de sua atividade produtiva, dispondo a lei sobre os meios de financiar o seu desenvolvimento.

De outro lado, prevê a alimentação como direito social (art. 6º), bem como, no § 1º do artigo 100 (quando trata dos precatórios), a CF define os débitos de natureza alimentícia como sendo aqueles decorrentes de salários, vencimentos, proventos, pensões e suas complementações, benefícios previdenciários e indenizações por morte ou por invalidez, fundadas em responsabilidade civil, em virtude de sentença judicial transitada em julgado.

Já em âmbito infraconstitucional, o Diploma legal que iremos abordar aqui é o Código de Processo Civil, embora haja menção à penhora em outras leis esparsas.

Dessa forma, iremos focar nossa análise nos artigos 831 e seguintes do CPC.

Antes de determinar a penhora de bens e valores, é necessário oportunizar que o devedor pague sua dívida.

Desse modo, tratando-se de execução de quantia certa, o executado será citado para pagar a dívida no prazo de 03 (três) dias, contado da citação.

Além disso, o CPC prevê que, no mesmo mandado de citação constarão a ordem de penhora e a avaliação a serem cumpridas pelo oficial de justiça tão logo verificado o não pagamento no prazo assinalado, de tudo lavrando-se auto, com intimação do executado.

Sendo assim, a penhora deverá recair sobre tantos bens quantos bastem para o pagamento do principal atualizado, dos juros, das custas e dos honorários advocatícios, a serem indicados pelo exequente.

No entanto, o CPC possibilita que o próprio executado indique os bens, desde que demonstre que a constrição proposta lhe será menos onerosa e não trará prejuízo ao exequente. 

Se assim proceder, caberá ao juiz decidir sobre a aceitabilidade da penhora dos bens indicados pelo executado.

Todavia, se o oficial de justiça não encontrar o executado, o CPC autoriza o arresto de seus bens na quantidade que baste para garantir a execução.

Humberto Theodoro Júnior explica que se trata de uma medida cautelar específica para esses casos em que o oficial de justiça não encontra o executado.

No entanto, o CPC também afirma que não estão sujeitos à execução os bens que a lei considera impenhoráveis ou inalienáveis. Falaremos sobre isso agora.

Os bens impenhoráveis são aqueles que o Código optou por impedir, ou ao menos limitar em certa quantidade, sua afetação para adimplemento das obrigações do devedor.

Nesse sentido, Humberto Theodoro Júnior leciona que o artigo 833 do CPC enumera vários casos de bens patrimoniais disponíveis que são impenhoráveis, como os vestuários e pertences de uso pessoal, os vencimentos e salários, os livros, máquinas, utensílios e ferramentas necessários ao exercício da profissão, as pensões e montepios, o seguro de vida etc. 

O autor explica que essa limitação à penhorabilidade encontra explicação em razões diversas, de origem ético-social, humanitária, política ou técnico-econômica.

Vamos ver a redação do artigo 833 do CPC:

Art. 833. São impenhoráveis:

I – os bens inalienáveis e os declarados, por ato voluntário, não sujeitos à execução;

II – os móveis, os pertences e as utilidades domésticas que guarnecem a residência do executado, salvo os de elevado valor ou os que ultrapassem as necessidades comuns correspondentes a um médio padrão de vida;

III – os vestuários, bem como os pertences de uso pessoal do executado, salvo se de elevado valor;

IV – os vencimentos, os subsídios, os soldos, os salários, as remunerações, os proventos de aposentadoria, as pensões, os pecúlios e os montepios, bem como as quantias recebidas por liberalidade de terceiro e destinadas ao sustento do devedor e de sua família, os ganhos de trabalhador autônomo e os honorários de profissional liberal, ressalvado o § 2º ;

V – os livros, as máquinas, as ferramentas, os utensílios, os instrumentos ou outros bens móveis necessários ou úteis ao exercício da profissão do executado;

VI – o seguro de vida;

VII – os materiais necessários para obras em andamento, salvo se essas forem penhoradas;

VIII – a pequena propriedade rural, assim definida em lei, desde que trabalhada pela família;

IX – os recursos públicos recebidos por instituições privadas para aplicação compulsória em educação, saúde ou assistência social;

X – a quantia depositada em caderneta de poupança, até o limite de 40 (quarenta) salários-mínimos;

XI – os recursos públicos do fundo partidário recebidos por partido político, nos termos da lei;

XII – os créditos oriundos de alienação de unidades imobiliárias, sob regime de incorporação imobiliária, vinculados à execução da obra.

§ 1º A impenhorabilidade não é oponível à execução de dívida relativa ao próprio bem, inclusive àquela contraída para sua aquisição.

§ 2º O disposto nos incisos IV e X do caput não se aplica à hipótese de penhora para pagamento de prestação alimentícia, independentemente de sua origem, bem como às importâncias excedentes a 50 (cinquenta) salários-mínimos mensais, devendo a constrição observar o disposto no art. 528, § 8º , e no art. 529, § 3º .

§ 3º Incluem-se na impenhorabilidade prevista no inciso V do caput os equipamentos, os implementos e as máquinas agrícolas pertencentes a pessoa física ou a empresa individual produtora rural, exceto quando tais bens tenham sido objeto de financiamento e estejam vinculados em garantia a negócio jurídico ou quando respondam por dívida de natureza alimentar, trabalhista ou previdenciária.

Sobre esses bens, Humberto Theodoro Júnior explica que prevê a lei outros casos em que a impenhorabilidade se manifesta apenas em caráter relativo.

Assim, o autor explica que esses bens, por razões especiais, são preservados pelo CPC, que só autoriza sua excussão à falta de outros valores econômicos disponíveis no patrimônio do executado.

Com efeito, de acordo com o artigo 834 do CPC, podem ser penhorados, à falta de outros bens, os frutos e os rendimentos dos bens inalienáveis.

A discussão central deste artigo gira em torno do artigo 833, inciso IV e § 2º, do CPC, os quais já transcrevemos acima.

Trataremos, então, da penhora fundada em dívida alimentar e não alimentar.

De início, é importante falarmos sobre a penhora em dívida alimentar

Nesses casos, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é firme no sentido de que a impenhorabilidade de remunerações, disposta no inciso IV acima citado, comporta exceção quando se tratar de execução de dívida de natureza alimentar OU então quando a renda mensal for superior a 50 salários-mínimos.

Portanto, aquele que percebe mais de 50 salários-mínimos ou aquele que possua dívida de natureza alimentar, ainda que receba quantia inferior, não poderá alegar a impenhorabilidade de remunerações.

O STJ, no entanto, alerta para o fato de que, em qualquer circunstância, deverá ser preservado percentual capaz de dar guarida à dignidade do devedor e de sua família.

Exemplo: imagine o caso em que o devedor percebe uma renda mensal de R$ 3.000,00 e possui uma dívida de natureza alimentar no valor R$ 2.500,00 reais – por exemplo, estava devendo pensão alimentícia.

Nesse caso, embora o devedor não possa alegar a impenhorabilidade de sua remuneração, uma vez que está diante de uma dívida de caráter alimentício, a penhora não poderá deixar para o devedor apenas R$ 500,00 reais, sob pena de não conseguir sustentar a si próprio, tampouco sua família, naquele mês.

Já no que diz respeito à penhora em dívida não alimentar, o tema era controverso até recentemente. No entanto, o STJ parece ter pacificado a questão.

Sendo assim, a jurisprudência do STJ se firmou no sentido de que, em situações excepcionais, admite-se a relativização da regra de impenhorabilidade das verbas salariais prevista no art. 833, IV, do CPC/2015, a fim de alcançar parte da remuneração do devedor para a satisfação do crédito não alimentar.

Vamos entender. 

Até o CPC/1973, vigia a redação do artigo 649, que afirmava que essas verbas, dentre outras, eram ABSOLUTAMENTE impenhoráveis.

No entanto, a Corte Cidadã entendeu que o CPC de 2015, ao suprimir a palavra “absolutamente”, passou a tratar a impenhorabilidade como relativa.

Sendo assim, entende o STJ que o Código atual permite que a regra da impenhorabilidade seja afastada “à luz de um julgamento principiológico, em que o julgador, ponderando os princípios da menor onerosidade para o devedor e da efetividade da execução para o credor”.

Em qualquer caso, como já dito, deve-se preservar o suficiente para garantir a subsistência digna do devedor e de sua família.

→ Mas por que o STJ decidiu nesse sentido? Não seria uma interpretação contra legem?

O Relator, Ministro João Otávio de Noronha, citando a doutrina de Fredie Didier e Leonardo Carneiro da Cunha, externou que a fixação desse limite de 50 salários mínimos merece críticas, na medida em que se mostra muito destoante da realidade brasileira, tornando o dispositivo praticamente inócuo.

Além disso, de acordo com o julgado, o limite de 50 salários-mínimo não traduz o verdadeiro escopo da impenhorabilidade, que é a manutenção de uma reserva digna para o sustento do devedor e de sua família. 

Desse modo, a depender da realidade de cada caso concreto (o que, aliás, influenciará até mesmo no percentual da penhora a ser fixado), mostra-se possível a  relativização do § 2º do art. 833 do CPC/2015, de modo a se autorizar a penhora de verba salarial inferior a 50 salários mínimos.

No entanto, o STJ não deixou de destacar que essa relativização reveste-se de caráter excepcional “e dela somente se deve lançar mão quando restarem inviabilizados outros meios executórios que garantam a efetividade da execução”.

Portanto, pessoal, essa foi nossa breve análise sobre a penhora em dívida não alimentar, destacando, ainda, o entendimento do Superior Tribunal de Justiça (STJ) sobre o tema.

Vimos a previsão constitucional e legal da penhora e das dívidas de caráter alimentar, bem como os pressupostos básicos para a medida constritiva, além de quais são as verbas impenhoráveis e inalienáveis.

Além disso, vimos que a regra da impenhorabilidade do artigo 833, inciso IV, comporta exceção (i) quando se tratar de execução de dívida de natureza alimentar; (ii) quando a renda mensal for superior a 50 salários-mínimos; e (iii) mesmo nos casos em que não seja alimentar e não seja superior ao valor citado, as circunstâncias do caso concreto autorizem, de forma excepcional, a aplicação da medida.

No entanto, em qualquer caso deve ser assegurada a manutenção de uma reserva digna para o sustento do devedor e de sua família. 

Até a próxima!

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