Violência política de gênero: ataques à Marina Silva

Violência política de gênero: ataques à Marina Silva

* Thiago de Paula Leite é procurador do Estado de São Paulo e professor de direito ambiental e agrário do Estratégia.

Entenda o que aconteceu

A ministra do meio ambiente, Marina Silva, sofreu uma série de ataques enquanto participava de audiência na Comissão de Infraestrutura do Senado.

Em meio à discussão, o presidente do colegiado, Marcos Rogério, do PL-RO, exigiu que Marina se colocasse “no seu lugar”. O senador Omar Aziz, do PSD-AM, disse que ela não tinha “direito” de fazer seu trabalho com base nas leis. Já Plínio Valério, do PSDB-AM, disse que a respeitava como mulher, mas não como ministra.

O senador Plínio Valério, que já havia afirmado, anteriormente, ter vontade de enforcar Marina Silva, agora afirmou que a “mulher merece respeito, e a ministra, não“.

Imagine o que é tolerar a Marina seis horas e dez minutos sem enforcá-la.” (2023)

Marina Silva disparou:

“Sou uma mulher de luta e de paz. Mas, nunca vou abrir mão da luta. Não é pelo fato de eu ser mulher que vou deixar as pessoas atribuírem a mim coisas que [eu] não disse...

Eu não posso aceitar que alguém me diga qual é o meu lugar. Meu lugar é o da defesa da democracia, do meio ambiente, da luta contra a desigualdade, da proteção da biodiversidade e da promoção da infraestrutura necessária ao país”.

Após o bate-boca, a ministra exigiu um pedido de desculpas, o que não ocorreu, acarretando sua retirada da audiência.

“Eu não fui convidada lá por ser mulher, fui convidada por ser ministra. Obviamente, me retirei da audiência. Estou aberta ao diálogo”.

Violência política de gênero

O Congresso aprovou, em 2021, a lei nº 14.192, que visa combater a violência política de gênero.

Violência política de gênero

As mulheres podem sofrer violência quando concorrem, já eleitas, durante o mandato ou durante o exercício de um cargo político.

Esse tipo de violência é considerado uma das principais causas da sub-representação das mulheres no Parlamento e nos espaços de poder e decisão, prejudicando a democracia no país.

Na violência política de gênero, a maior vítima é a democracia!

Tipos de violência política de gênero[1]

  • Ameaças à candidata, por palavras, gestos ou outros meios, de lhe causar mal injusto e grave;
  • Interrupções frequentes de sua fala em ambientes políticos, impedimento para usar a palavra e realizar clara sinalização de descrédito;
  • Desqualificação, ou seja, indução à crença de que a mulher não possui competência para a função a que ela está se candidatando ou para ocupar o espaço público onde se apresenta;
  • Violação da sua intimidade, por meio de divulgação de fotos íntimas, dados pessoais ou e-mails, inclusive montagens;
  • Difamação da candidata, atribuindo a ela fato que seja ofensivo a sua reputação e a sua honra;
  • Desvio de recursos de campanhas das candidaturas femininas para as masculinas;
  • Violência emocional por meio de manipulação psicológica, que leva a mulher e todos ao redor a acharem que ela enlouqueceu;
  • Quando o homem explica à mulher coisas simples, como se ela não fosse capaz de compreender;
  • A constante interrupção, impedindo a mulher de concluir pensamentos ou frases;
  • Questionamento sobre a aparência física e forma de vestir;
  • Quando um homem se apropria da ideia de uma mulher.

O artigo 326-B, do Código Eleitoral, no entanto, não pode ser aplicado ao caso Marina Silva, porque ele se restringe à violência sofrida por candidata ou detentora de mandato eletivo.

Marina Silva é ministra de Estado, e não disputou as eleições em 2022, não podendo se beneficiar dessa norma.

Código Eleitoral

Art. 326-B. Assediar, constranger, humilhar, perseguir ou ameaçar, por qualquer meio, candidata a cargo eletivo ou detentora de mandato eletivo, utilizando-se de menosprezo ou discriminação à condição de mulher ou à sua cor, raça ou etnia, com a finalidade de impedir ou de dificultar a sua campanha eleitoral ou o desempenho de seu mandato eletivo.    

Pena - reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.   

Parágrafo único. Aumenta-se a pena em 1/3 (um terço), se o crime é cometido contra mulher:   

I - gestante;   

II - maior de 60 (sessenta) anos;   

III - com deficiência.

Mas isso não quer dizer que os ataques não possam ser enquadrados como crimes ou passíveis de indenização.

Quebra de decoro parlamentar

Os ataques verbais foram considerados, por parte da opinião pública, como sendo:

  • Misóginos: atitudes misóginas são comportamentos que demonstram ódio, aversão e preconceito contra mulheres, baseados na condição de gênero. Elas podem se manifestar de diversas formas, desde discursos e expressões que rebaixam as mulheres, até ações e práticas que as excluem e violam seus direitos.
  • Sexistas: práticas sexistas são comportamentos, atitudes ou crenças que discriminam pessoas com base no seu sexo ou gênero, geralmente levando à inferiorização ou marginalização de mulheres e pessoas LGBTQIA+.
  • Machistas: atos machistas são comportamentos que expressam a crença na superioridade masculina e a subordinação das mulheres, rejeitando a igualdade de direitos entre os géneros. São atos que manifestam desvalorização, preconceito e discriminação contra mulheres, podendo ir desde micro-agressões e comentários sexistas até violência física e sexual.
  • Violentos: qualquer ato com o objetivo de excluir a mulher do espaço político, restringir seu acesso ou induzi-la a tomar decisões contrárias à sua vontade.

Logo, caso a ministra Marina Silva entenda que sofreu ataque à sua honra, nada a impede de apresentar queixa-crime por injúria, além de pleitear indenização por danos morais sofridos com o ataque.

A injúria atinge a honra subjetiva da vítima, ou seja, a dignidade ou o decoro de alguém, e consiste em atribuir qualidades negativas à pessoa, xingá-la ou menosprezá-la, enquanto a difamação atinge a honra objetiva, ou seja, a reputação de alguém perante a sociedade.

Além disso, o senador que proferiu os ataques à ministra poderá responder perante o Conselho de Ética do Senado por quebra do decoro parlamentar.

A quebra do decoro parlamentar, ou vício de decoro parlamentar, refere-se à violação do padrão ético de comportamento esperado dos parlamentares, não se limitando a atos no Plenário.

Medidas disciplinares

Após denúncia apresentada ao Conselho de Ética do Senado, o senador poderá sofrer as medidas disciplinares previstas no Código de Ética, a saber:

a) advertência;

b) censura;

c) perda temporária do exercício do mandato;

d) perda do mandato.

Ótimo tema para provas de direito constitucional, direito eleitoral e direito penal.


[1]SECRETARIA da Mulher. Violência Política de Gênero, a maior vítima é a democracia. Câmara dos Deputados. Disponível em: <https://www2.camara.leg.br/a-camara/estruturaadm/secretarias/secretaria-da-mulher/violencia-politica-de-genero-a-maior-vitima-e-a-democracia>.


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