Justiça reconhece vínculo familiar de casal em “Situação de Rua” com seu cachorro: um marco na proteção das Famílias Multiespécies

Justiça reconhece vínculo familiar de casal em “Situação de Rua” com seu cachorro: um marco na proteção das Famílias Multiespécies

Em uma decisão inovadora, o juiz Diego Santos Teixeira, do 15º Juizado Especial da Fazenda Pública de Curitiba, reconheceu o vínculo familiar entre um casal em situação de rua e seu cão, Rock Merlini.

Esta decisão estabelece um precedente significativo no contexto jurídico brasileiro. Ademais, isso reflete uma compreensão avançada dos laços afetivos entre humanos e animais de estimação, alinhando-se aos princípios constitucionais e à evolução das relações familiares.

A decisão foi provocada por um pedido da Defensoria Pública do Paraná, que representava Carlos Merlini, de 46 anos, e seu cão Rock Merlini.

Após um atropelamento em 18 de maio de 2024, Rock recebeu tratamento da prefeitura de Curitiba. Posteriormente, ele foi encaminhado para uma unidade de resgate, onde ficou disponível para adoção.

Assim, Carlos e sua companheira, vivendo em situação de rua, buscaram auxílio da Defensoria Pública para reaver seu cão, demonstrando o forte vínculo afetivo entre eles.

O juiz Teixeira baseou sua decisão no artigo 226 da Constituição Federal, que estabelece que a família é a base da sociedade, merecendo especial proteção do Estado:

Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.

Além disso, a Constituição, em seu artigo 1º, inciso III, também enfatiza a dignidade da pessoa humana como um dos fundamentos da República Federativa do Brasil:

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

III - a dignidade da pessoa humana;

Essa dignidade inclui o reconhecimento dos laços afetivos e familiares, independentemente de sua composição tradicional.

Ao analisar o caso, o juiz considerou evidências apresentadas, como o Boletim de Ocorrência e reportagens, que demonstravam a relação de afeto entre Carlos e Rock. Ele ressaltou que o vínculo afetivo justifica a atuação do Poder Judiciário para proteger os direitos fundamentais. Tal proteção também abrange o direito à convivência familiar, que se estende aos animais de estimação no contexto de uma família multiespécie.

Análise da decisão da Justiça

A decisão do juiz Diego Santos Teixeira marca um avanço significativo na jurisprudência brasileira ao reconhecer juridicamente a família multiespécie.

Este entendimento alinha-se com o crescente reconhecimento internacional dos direitos dos animais e do vínculo afetivo que humanos estabelecem com seus pets.

Justiça

Em um país com mais de 139 milhões de animais de estimação, o Brasil é a terceira nação do mundo em número de pets. Historicamente, consideravam-se os animais simples bens semoventes, parte do patrimônio de seu titular. Com a evolução do entendimento sobre a complexidade dos animais e as novas relações entre eles e as pessoas, surgiu o debate sobre o enquadramento jurídico adequado para os pets. (justiça)

Nesse sentido, o mundo jurídico passou a discutir termos como “família multiespécie”, reconhecendo direitos intrínsecos aos animais. No cotidiano, vemos “pais de pet” tratando seus animais como membros da família, o que reflete a transformação na percepção social e jurídica dos animais.

Precedentes no STJ

Em dois precedentes recentes, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) lançou novas luzes sobre a caracterização jurídica dos animais de estimação. Em 2018, a Quarta Turma analisou a possibilidade de reconhecimento do direito de visitas após a dissolução de união estável. Aplicaram analogicamente as regras para a guarda de filhos menores.

O relator, ministro Luis Felipe Salomão, destacou que o regramento jurídico dos bens não é suficiente para resolver disputas envolvendo animais de estimação, reconhecendo-os como um “terceiro gênero”:

“Penso que a resolução deve, realmente, depender da análise do caso concreto, mas será resguardada a ideia de que não se está diante de uma ‘coisa inanimada’, sem lhe estender, contudo, a condição de sujeito de direito. Reconhece-se, assim, um terceiro gênero, em que sempre deverá ser analisada a situação contida nos autos” (Processo em segredo de justiça).

Em outro caso, a Terceira Turma abordou a divisão de despesas com animais de estimação após o fim de um relacionamento. Enfatizou-se a necessidade de compatibilizar as regras do regime de bens da união estável com a natureza particular dos animais, reconhecendo-os como seres dotados de sensibilidade.

Projetos de lei

No âmbito legislativo, há diversos projetos de lei em tramitação que buscam alterar a caracterização jurídica dos animais. O PLC 27/2018, por exemplo, propõe que se deixe de considerar os animais como objetos. Assim, eles passariam a ter natureza jurídica sui generis, como sujeitos de direitos despersonificados. Esse projeto, aprovado no Senado, reconhece nos animais a condição de seres sencientes e altera o Código Civil para que não sejam mais considerados bens semoventes.

Conclusão

A decisão do juiz Diego Santos Teixeira representa um marco na proteção dos direitos das famílias multiespécies, especialmente no contexto de pessoas em situação de rua. Esta decisão reconhece a importância dos laços afetivos entre humanos e animais. Ademais, isso reforça a proteção da dignidade e dos direitos fundamentais das pessoas em situação de vulnerabilidade.

Repise-se que a decisão é respaldada pela evolução doutrinária e jurisprudencial que reconhece a importância dos vínculos afetivos. Dessa forma, o reconhecimento da família multiespécie é um reflexo da proteção constitucional à dignidade da pessoa humana e ao direito à convivência familiar. (justiça)

Além disso, a Lei nº 13.146/2015, conhecida como Estatuto da Pessoa com Deficiência, reforça a necessidade de proteção aos direitos fundamentais, incluindo a convivência familiar em suas diversas formas.


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