Poder Judiciário garante direito a isenção de IPVA e ICMS a contribuinte com deficiência auditiva

Poder Judiciário garante direito a isenção de IPVA e ICMS a contribuinte com deficiência auditiva

Poder Judiciário garante isenção de IPVA e ICMS a contribuinte com deficiência auditiva. Saiba mais sobre essa decisão e seus impactos.

*João Paulo Lawall Valle é Advogado da União (AGU) e professor de direito administrativo, financeiro e econômico do Estratégia carreira jurídica.

isenção de IPVA e ICMS

Entenda o caso – Isenção de IPVA e ICMS

Um contribuinte, residente no Estado do Rio Grande do Sul, ajuizou ação declaratória c/c repetição de indébito em face do Estado do Rio Grande do Sul requerendo o reconhecimento do seu direito a isenção dos tributos estaduais Imposto sobre a propriedade de veículos automotores (IPVA) e Imposto sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação (ICMS) incidentes sobre um determinado veículo que havia adquirido.

O argumento para a solicitação do benefício tributário era a sua condição de portador de deficiência auditiva.

No bojo da ação judicial em curso na comarca de Porto Alegre o Autor produziu prova documental (laudo médico) comprovando a sua condição de deficiente auditivo portador “deficiência auditiva bilateral severa” em ambos os ouvidos.

Dadas as provas produzidas pelo Autor na petição inicial, o Poder Judiciário gaúcho deferiu o pedido de tutela provisória de urgência para determinar à Fazenda Estadual se abster de exigir o pagamento do IPVA e do ICMS em relação ao veículo de propriedade do autor.

Análise Jurídica

Inicialmente, analisando sob a ótica processual civil, é relevante recordar que de acordo com o artigo 300 do Código de Processo Civil, o deferimento de pedido de tutela provisória de urgência é medida excepcional e que demanda a demonstração da probabilidade do direito e do perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.

No caso em discussão a questão é uma lide tributária que questiona em juízo a juridicidade da incidência dos impostos estaduais IPVA e ICMS sobre veículo automotor cujo proprietário é pessoa portadora de deficiência.

Ambos os tributos questionados judicialmente (IPVA e ICMS) tem previsão constitucional no artigo 155 da Constituição Federal de 1988, da seguinte forma:

Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre:         

I - transmissão causa mortis e doação, de quaisquer bens ou direitos;        

II - operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior;

III - propriedade de veículos automotores.

Como se trata de impostos de competência estadual, as normas que concedem isenções tributárias são, igualmente, de competência do Estado da Federação respectivo. No caso do Estado do Rio Grande do Sul, as regras de isenção do IPVA constam do artigo 4º, IV da Lei estadual nº 8.115/1985, que prevê o seguinte:

Art. 4.º São isentos do imposto: 

(...) 

VI - os portadores de deficiência física, visual, mental severa ou profunda, ou autistas, proprietários de veículo automotor de uso terrestre, obedecidas as condições previstas no Regulamento do Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores e nas instruções baixadas pela Receita Estadual; (Redação dada pela Lei n.º 14.381/13) (Vide Lei n.º 13.320/09, que consolida a legislação relativa à pessoa com deficiência) 

Por sua vez, o Regulamento do ICMS gaúcho (Decreto nº 37.699/1997) previu o seguinte acerca da isenção tributária para portadores de deficiência:

Art. 9° - São isentas do imposto as seguintes operações com mercadorias: 

(…) 

XL - saídas, no período de 1º de janeiro de 2013 a 30 de abril de 2024, de veículo automotor novo quando adquirido por pessoas com deficiência física, visual, mental severa ou profunda, síndrome de Down ou autistas, diretamente ou por intermédio de seu representante legal;

Importante destacar que a deficiência auditiva tem a sua definição trazida pela Lei 14.768/2023, sendo considerada a limitação de longo prazo da audição, unilateral total ou bilateral parcial ou total, a qual, em interação com uma ou mais barreiras, obstrui a participação plena e efetiva da pessoa na sociedade, em igualdade de condições com as demais pessoa.

Como se percebe da legislação estadual transcrita acima, os portadores de deficiência auditiva não constam expressamente do rol de isenção de ICMS e IPVA. Porém, a hermenêutica jurídica (e a ampla capacidade de interpretações elásticas do Poder Judiciário), no caso concreto, ampliou o sentido da literalidade das normas que concederam isenções de IPVA e ICMS para incluir e beneficiar os portadores de deficiência auditiva.

De acordo com o prolator da decisão que deferiu a tutela provisória de urgência, a não extensão da isenção do IPVA e do ICMS aos portadores de deficiência auditiva afronta ao princípio da igualdade expresso na Constituição Federal.

Além disso, como fundamento infralegal o juízo invocou o Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei nº 13.146/2015) com dois argumentos diversos:

  • Artigo 2º: ao definir pessoa com deficiência traz o impedimento sensorial, o que inclui a limitação auditiva;
  • Artigo 4º: dispositivo que assegura e reforça o direito à igualdade e veda qualquer espécie de discriminação em relação aos portadores de deficiência.

Em suma, o juízo que analisou o pedido de tutela provisória de urgência, com base em interpretação jurídica, ampliou o efeito de norma estadual isentiva.

Mas esta forma de agir não violou o artigo 111 do Código Tributário Nacional que determina a interpretação literal da legislação tributária que disponha sobre a outorga de isenção?

Com fundamento na doutrina do professor Leandro Paulsen o entendimento adotado foi de que o artigo 111 do CTN veda a utilização de analogia para a outorga de isenção tributária, não havendo proibição de interpretação mais ampla que use outros métodos interpretativos.

Assim ensina o renomado doutrinador:

“…deve-se entender, por exemplo, o disposto no art. 111 do Código Tributário Nacional, o qual estabelece que se interpretará ‘literalmente’ a legislação tributária que disponha sobre ‘outorga de isenção’. Dele resulta somente uma proibição à analogia, e não uma impossibilidade de interpretação mais ampla”.

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