Info 826 do STJ – Interrupção de energia elétrica: quando é permitida e como deve ser comunicada, à luz do REsp 1.812.140-RS

Info 826 do STJ – Interrupção de energia elétrica: quando é permitida e como deve ser comunicada, à luz do REsp 1.812.140-RS

Interrupção de energia elétrica: Info 826 do STJ esclarece sobre suspensão por inadimplência.

interrupção de energia elétrica

Imagine que você está lá, tranquilo em casa, e de repente… tudo fica escuro.  As perguntas surgem: se for uma emergência, tipo um temporal que derrubou os fios, há responsabilidade da concessionária?  Mas se for algo programado, tipo uma manutenção na rede?

Agora, se você receber um aviso por escrito ou ver um alerta bem chamativo na sua conta de luz sobre um corte programado, muda algo?

Veja, a interrupção no fornecimento de energia elétrica é um tema que gera muitas dúvidas e reclamações entre os consumidores. 

Afinal, em quais situações as concessionárias podem cortar a luz?  E como devem avisar os usuários? 

Um recente julgado do Superior Tribunal de Justiça (STJ) lançou luz sobre essas questões, estabelecendo importantes parâmetros para a atuação das empresas do setor elétrico no informativo 826 do STJ.

O caso concreto – Interrupção de energia elétrica

No Recurso Especial nº 1.812.140-RS, julgado em setembro de 2024, a Primeira Turma do STJ analisou uma situação em que consumidores tiveram prejuízos com a perda de 300 litros de leite armazenados em um resfriador, devido a uma interrupção programada de energia que durou 12 horas.

Entretanto, o cerne da questão era que a concessionária havia divulgado o aviso de desligamento por meio de estações de rádio locais. 

Contudo, o consumidor não conseguiu ser informado.

Nesse sentido, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul entendeu que essa forma de comunicação não atendia aos requisitos estabelecidos pela Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) em sua Resolução nº 414/2010.

O que diz a lei?

Contudo, para compreender melhor a questão, é fundamental conhecer o que estabelece a Lei nº 8.987/1995, conhecida como Lei de Concessões. 

Em seu artigo 6º, §3º, ela prevê que não se caracteriza como descontinuidade do serviço a interrupção:

I – Em situação de emergência; 

II – Após prévio aviso, quando motivada por razões de ordem técnica ou de segurança das instalações; 

III – Após prévio aviso, por inadimplemento do usuário, considerado o interesse da coletividade.

O legislador, portanto, reconheceu que existem situações em que a interrupção do fornecimento é necessária e até mesmo benéfica para a manutenção da qualidade e segurança do sistema elétrico. 

No entanto, estabeleceu como regra a necessidade de prévio aviso aos consumidores, exceto se houver emergência.

Impacto da decisão do STJ – Interrupção de energia elétrica

Entretanto, ao analisar o caso, o STJ foi além da mera interpretação literal da Lei de Concessões. 

O Ministro Paulo Sérgio Domingues, relator do acórdão, propôs uma leitura conjunta desse dispositivo com os artigos 14 e 22 do Código de Defesa do Consumidor, que tratam da responsabilidade do fornecedor e da continuidade dos serviços essenciais.

O STJ entendeu que, embora a lei não especifique a forma como deve ser feito o aviso prévio, isso não significa que as concessionárias tenham total liberdade para escolher o meio de comunicação. 

Ao contrário, devem observar as normas estabelecidas pelo órgão regulador do setor, no caso, a ANEEL.

Isto é, a decisão reconheceu o poder normativo das agências reguladoras. O STJ ressaltou que, ao editar normas técnicas para o setor, a ANEEL está exercendo uma competência delegada pelo legislador, desde que respeitados os limites constitucionais e legais.

No caso específico, a Resolução nº 414/2010 da ANEEL estabelece que a notificação sobre interrupções programadas deve ser feita por escrito, com entrega comprovada, ou impressa em destaque na fatura de energia

Essa norma, segundo o STJ, não extrapola os limites do poder regulamentar e deve ser observada pelas concessionárias.

Nesse sentido, a decisão do STJ traz importantes pontos tanto para os consumidores quanto para as empresas do setor elétrico:

  1. O respeito ao direito à informação:
    O consumidor tem direito a ser previamente informado sobre interrupções programadas no fornecimento de energia, de forma clara e eficaz.
  2. Há necessidade de observância das normas regulatórias:
    As concessionárias devem seguir não apenas a lei em sentido estrito, mas também as normas editadas pela agência reguladora do setor.

Por fim, caso haja o descumprimento das normas sobre aviso prévio pode gerar o dever de indenizar eventuais prejuízos sofridos pelos consumidores.

Como o tema já foi cobrado em concursos:

Prova: CESPE / CEBRASPE – 2023 – MPE-SC – Promotor de Justiça Substituto (fase vespertina)

A respeito do Código de Defesa do Consumidor (CDC), da relação jurídica de consumo, da responsabilidade do fornecedor, da defesa do consumidor e dos objetivos, princípios e direitos básicos do consumidor, julgue o item que se segue. 

Incide o CDC em ação de indenização por danos morais contra empresa concessionária de energia elétrica devido à interrupção no fornecimento de energia elétrica por período demasiadamente longo.  (Certo)

Ementa do que foi decidido pelo STJ

Assim, eis a ementa e nossos grifos do que foi decidido pelo STJ:

ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. INTERRUPÇÃO PROGRAMADA DO FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA. REMESSA DE AVISO PRÉVIO À UNIDADE CONSUMIDORA. OBSERVÂNCIA DA FORMA ESTABELECIDA PELO ÓRGÃO REGULADOR. LEGÍTIMO EXERCÍCIO DO PODER NORMATIVO. INTERPRETAÇÃO DA RESOLUÇÃO 414/2010 DA ANEEL. MATÉRIA INSUSCETÍVEL DE EXAME NA VIA DO RECURSO ESPECIAL. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E IMPROVIDO.

1. A interrupção do fornecimento de energia, por razões de ordem técnica ou segurança, deve ser previamente avisada à unidade consumidora, nos termos do art. 6º, § 3º, I, da Lei 8.987/1995. O dispositivo deve ser interpretado no sentido de que a prévia notificação precisa observar a forma eventualmente estabelecida pelo órgão regulador.

2. Para o Supremo Tribunal Federal, as agências reguladoras exercem ilegitimamente o seu poder normativo quando não observam as balizas legais e constitucionais. Não se identifica vício dessa ordem na Resolução 414/2010 da ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica), vigente ao tempo dos fatos. Isso porque nela se adotava uma sistemática equilibrada, dando ao fornecedor a alternativa de que o aviso prévio fosse feito nas faturas regularmente emitidas e dispensando a comunicação do usuário nas situações de emergência.

3. Sem adentrar a aplicação dada pelo Tribunal de origem aos dispositivos da Resolução 414/2010, conclui-se que não há nada na Lei 8.987/1995 que assegure ao fornecedor, tal como defende a parte recorrente, a liberdade de escolha da forma pela qual será cumprido o dever de prévio aviso. Em vez disso, o preceito legal deve ser interpretado em consonância com os princípios da continuidade, da adequação, da eficiência e da segurança dos serviços, nos termos dos arts. 14 e 22 do Código de Defesa do Consumidor. Presume-se que esses princípios são alcançados quando observada a forma estabelecida pelo órgão regulador.

(...)

(REsp n. 1.812.140/RS, relator Ministro Paulo Sérgio Domingues, Primeira Turma, julgado em 10/9/2024, DJe de 16/9/2024.)

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