Bebe é decapitado durante parto e médica é acusada de homicídio

Bebe é decapitado durante parto e médica é acusada de homicídio

Olá, pessoal!

Sou o professor Guilherme Rezende, professor de Processo Penal e de Legislação Institucional (MP), promotor de Justiça no MPPR, ex-Defensor Público da União, ex- Procurador da Fazenda Nacional e doutorando e mestre em direito.

Trouxe abaixo um tema para debate: Bebe é decapitado durante parto e médica é acusada de homicídio.

No presente artigo abordaremos a conduta da médica que durante o parto natural de uma criança acabou por decapitá-la ao puxar a sua cabeça, em um trabalho de parto que durou cerca de 10 horas.

Em qual tipo penal incorreu a médica? Para responder à pergunta visitamos inicialmente questões atinentes aos crimes contra a vida, e, em seguida, fizemos considerações sobre o elemento subjetivo (dolo e culpa), para, ao final, apresentar as conclusões e implicações de uma ou de outra tipificação.

Entenda…

O caso teria ocorrido nos Estados Unidos, na Georgia. A mãe da criança teria entrado em trabalho de parto e o bebê ficou preso por aproximadamente 10 horas, e, mesmo assim, a equipe médica optou pelo parto natural.

De acordo com a família, os médicos, no momento da retirada da criança, puxaram a cabeça e o pescoço do bebê com tanta força, que os ossos do crânio, da cabeça e do pescoço foram quebrados, resultando assim na decapitação.

Faremos uma análise do caso, levando em consideração a versão apresentada na reportagem, e a partir da legislação brasileira.

A Constituição Federal consagra o direito à vida dentre os direitos e garantias fundamentais. Assim, cabe ao Estado garantir o direito à vida, e mais do que isso, a uma vida digna; e, ainda, assegurar que não ocorram violações a esse direito, por meio de um marco normativo adequado.

O Código Penal tem um capítulo inteiro dedicado a proteger o bem jurídico vida, a partir do artigo 121, tipificando as condutas de homicídio, infanticídio, aborto e induzimento e instigação ao suicídio. As penas vão de 1 (por exemplo, no homicídio culposo) a 30 anos (por exemplo, no homicídio qualificado).

No caso narrado, a médica teria provocado o resultado morte do bebê. A sua conduta, a não ser que possa ser atribuída ao acaso, uma fatalidade, assume relevância do ponto de vista jurídico-penal, justificando a atuação das instâncias de controle.

A primeira questão a ser observada para fins penais é se o bebê estava vivo ou se havia viabilidade da vida por ocasião do parto. Caso ele estivesse morto, por qualquer razão, poderíamos pensar no crime previsto no artigo 211, do CP, a destruição, subtração ou ocultação de cadáver, reputando cadáver “como o corpo humano morto, enquanto mantida a sua aparência como tal.” (Rogério Greco, CP Comentado, p. 727).

Vencida essa etapa, e considerando que havia vida humana e que a causa da morte foi, de fato, a quebra de ossos e a decapitação, a próxima questão a ser resolvida é quanto à tipificação da conduta.

Não há que se falar em infanticídio (artigo 123, do CP), pois o crime não foi cometido pela mãe, tampouco em estado puerperal, muito menos a médica teria agido, segundo consta, orientada pela mãe ou mancomunada com ela.

Ficaríamos, então, com a opção do homicídio ou do aborto.

O homicídio vem previsto no artigo 121, do CP (matar alguém), ao passo que o aborto vem previsto a partir do artigo 124, do CP (provocar aborto). O enquadramento típico vai depender de ter ou não ter sido iniciado o parto. Antes dele, temos o aborto. Depois, temos o homicídio.

Assim, como a conduta da médica ocorreu durante o parto, é dizer, após o início deste, não se pode falar em aborto, sendo adequada a consideração da conduta como homicídio mesmo.

Então, passamos ao próximo passo: agiu a médica com dolo ou culpa?

No dolo, o agente quer o resultado ou assume o risco de produzi-lo, conforme artigo 18, I, do CP; enquanto na culpa, o agente deixa de observar um dever objetivo de cuidado (negligência, imprudência ou imperícia).

A imprudência é a conduta positiva praticada pelo agente que não observa um dever de cuidado. A negligência, por seu turno, é a conduta negativa, é o deixar de observar uma diligência normal que se impunha. Por fim, a imperícia consiste na inaptidão do agente para o exercício de arte, profissão ou ofício.  

É sabido que os atendimentos na área da saúde são regidos por inúmeros protocolos e orientações, inclusive o Ministério da Saúde editou uma cartilha contendo as Diretrizes Nacionais de Assistência ao Parto Normal, indicando as condutas a serem observadas pelos profissionais, desde o atendimento até o pós-parto.

Embora pisando em terreno desconhecido, mas valendo-nos de consulta à rede mundial de computadores, encontramos artigo da MSD que lista uma série de complicações que podem advir do parto normal, dentre eles o trabalho de parto que progride muito lentamente e a desproporção feto-pélvica. A mesma MSD indica as possíveis soluções a serem adotadas, como o início artificial do trabalho de parto, o uso de fórceps ou extrator a vácuo e o parto por cesariana.

São condutas que nós, profissionais do direito, desconhecemos, mas que fazem parte do dia-a-dia médico e que se espera sejam de conhecimento do profissional da área da saúde.

Desta forma, se admitirmos que a médica violou um dever de cuidado, ignorando os protocolos sanitários, a sua conduta deve se subsumir ao homicídio culposo, por ter ela agido com imperícia.

De outro lado, se o erro médico é flagrante a ponto de se afirmar que ela simplesmente assumiu o risco de produzir o resultado, ela deixa o campo da culpa para alçar o dolo, caso em que o homicídio seria doloso. Aqui é necessário conhecimento especializado para se fazer essa afirmação.

Vale dizer que a variação na tipificação levará a penas bem diferentes. No homicídio culposo, a pena vai de 1 a 3 anos, ao passo que no doloso, de 6 a 20 anos, se simples, e de 12 a 30, se qualificado. O doloso é julgado pelo Tribunal do Júri, ao passo que o culposo pelo juiz singular.

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