Perdeu o timing, perdeu o ANPP: quando (não) reagir à recusa do Ministério Público

Perdeu o timing, perdeu o ANPP: quando (não) reagir à recusa do Ministério Público

Explicação

No julgamento do AgRg no Acordo no AREsp 2.600.503-ES (Informativo n.º 856), o Superior Tribunal de Justiça fixou importante diretriz quanto ao momento adequado para a defesa técnica se insurgir contra a recusa do Ministério Público à celebração do Acordo de Não Persecução Penal (ANPP).

Segundo a Corte, o pedido de celebração do ANPP deve ser formulado na primeira oportunidade de manifestação da defesa nos autos, sob pena de preclusão consumativa. Ou seja, se a defesa se omite no momento processual apropriado — geralmente a resposta à acusação — perde de forma definitiva a possibilidade de invocar o acordo.

A jurisprudência também firmou que a ausência de notificação formal da recusa por parte do Ministério Público não impede a consumação da preclusão, impondo à defesa o ônus de agir no primeiro momento em que se manifesta nos autos.

Aspectos jurídicos relevantes

O Acordo de Não Persecução Penal é um mecanismo de justiça penal negocial pré-processual, introduzido pela Lei n.º 13.964/2019, e encontra fundamento no art. 28-A do CPP.

Trata-se de proposta oferecida exclusivamente pelo Ministério Público quando preenchidos certos requisitos legais, cujo objetivo é evitar a instauração da ação penal por meio de uma resposta consensual e despenalizadora.

Requisitos

A seguir, sistematizam-se os requisitos legais e jurisprudenciais para sua celebração:

A) Viabilidade da imputação

É necessário que haja indícios suficientes de autoria e materialidade que justificariam o oferecimento da denúncia. O ANPP não se aplica em hipóteses de arquivamento (Resolução CNMP 181/2017, art. 18, § 2º).

B) Vedação em crimes com violência ou grave ameaça à pessoa

C) Pena mínima inferior a 4 anos

É necessário que a pena mínima abstratamente cominada ao delito seja inferior a 4 anos.

Consideram-se qualificadoras e causas de aumento/diminuição, desconsiderando agravantes/atenuantes. Aplica-se a maior fração de diminuição e a menor de aumento (Res. CNMP 181/2017, art. 18, § 4º).

O concurso de crimes deve ser avaliado no cômputo da pena. Já a continuidade delitiva não impede o acordo, conforme reconhecido no Informativo 829 do STJ.

D) Confissão formal e circunstanciada

A confissão deve ser feita perante o Ministério Público, com assistência técnica, e registrada por meio audiovisual (Res. CNMP 181/2017, art. 18-A). Não é exigida confissão prévia na fase policial (STJ, Informativo 843).

Ainda que o investigado negue os fatos durante a investigação, o MP deve designar audiência para oferta do acordo, conforme o HC 657.165/RJ, o Enunciado 13 da I Jornada de Direito Penal e Processo Penal do CJF/STJ e a Res. CNMP 289/2023.

E) Primariedade e não habitualidade

Preclusão consumativa

O ANPP é vedado a reincidentes e àqueles com conduta criminosa habitual, reiterada ou profissional (art. 28-A, § 2º, II).

F) Subsidiariedade em relação à transação penal

O ANPP não é cabível se for possível a transação penal (art. 28-A, § 2º, I). Por outro lado, a inviabilidade do ANPP não impede a suspensão condicional do processo, conforme o Informativo 828 do STJ.

G) Juízo de suficiência e necessidade

O Ministério Público deve fundamentar que o acordo é necessário e suficiente à reprovação e prevenção do delito (CP, art. 59 – analogia de critérios).

Trata-se de discricionariedade regrada, sem constituir direito subjetivo do investigado (STJ, Jurisprudência em Teses – Edição 185). A recusa pode ser submetida ao órgão revisor do MP (art. 28-A, § 14, CPP), sem efeito suspensivo (AgRg no RHC 179.107/SP).

H) Vedações específicas fixadas pelos tribunais superiores

• Violência doméstica e de gênero: vedação expressa (art. 28-A, § 2º, IV).

• Racismo: vedado pelo STF, em razão de compromissos internacionais de combate à discriminação racial (HC 222.599).

• Homofobia e transfobia: equiparadas ao racismo pelo STF (ADO 26), vedando o ANPP (AREsp 2.607.96/STJ).

I) Tramitação e controle

A negociação do ANPP ocorre extrajudicialmente, com assinatura do acordo pelo investigado (com defensor), e posterior homologação judicial em audiência específica.

O juiz verifica apenas a legalidade e voluntariedade do ajuste, com decisão de natureza declaratória (art. 28-A, § 6º, CPP). Caso discorde dos termos, poderá devolvê-lo ao Ministério Público ou recusar a homologação — hipótese em que cabe recurso em sentido estrito (art. 581, XXV, CPP).

Consequências

O entendimento fixado pelo STJ impõe rigidez procedimental ao tempo da defesa, que deve agir desde o início da ação penal. A omissão quanto à recusa do MP ao ANPP, sem manifestação na primeira oportunidade útil (normalmente a resposta à acusação), implica preclusão consumativa, inviabilizando posterior reapreciação do pleito.

Como isso pode cair na sua prova?

Com base no art. 28-A do CPP e na jurisprudência atual, assinale a alternativa correta:

a) A confissão do investigado em sede policial é requisito legal para a celebração do ANPP.

b) A ausência de proposta de ANPP deve ser impugnada pela defesa na primeira oportunidade de manifestação nos autos.

c) O ANPP é cabível em crimes com violência doméstica se a pena mínima for inferior a 4 anos.

d) A negativa do MP obriga o juiz a conceder o acordo por analogia ao princípio da proporcionalidade.

e) O investigado tem direito subjetivo à celebração do ANPP caso preencha todos os requisitos legais.

Gabarito: b)

Justificativa:
Segundo o STJ (AREsp 2.600.503/ES), a defesa deve impugnar a ausência de proposta de ANPP na primeira oportunidade de manifestação nos autos, sob pena de preclusão consumativa. A alternativa b é a única correta.


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