Pejotização: contratado como PJ, mas cumpre horário e ordens

Pejotização: contratado como PJ, mas cumpre horário e ordens

Sou contratado como PJ, mas cumpro horário e recebo ordens (pejotização)

A Pejotização e os Requisitos da Relação de Emprego: Uma Análise à Luz da CLT e da jurisprudência atual

Pejotização

1. Pejotização: entenda

A pejotização, um fenômeno cada vez mais comum nas relações de trabalho atuais, refere-se à contratação de trabalhadores como pessoas jurídicas, mesmo na presença dos elementos fático-jurídicos da relação de emprego. Essa prática, embora possa parecer vantajosa para ambas as partes em um primeiro momento, visa à redução de encargos trabalhistas e previdenciários. Trata-se de uma fraude aos preceitos trabalhistas. Para entender como essa prática se insere no contexto jurídico trabalhista, é fundamental analisar os elementos que caracterizam a relação de emprego, conforme a CLT.

1.1. Elementos fático-jurídicos da Relação de Emprego

Ainda no estudo da pejotização, de acordo com o artigo 3º da CLT, a relação de emprego é caracterizada pela presença de quatro elementos essenciais: pessoalidade, onerosidade, habitualidade e subordinação. Vamos detalhar cada um desses requisitos:

  1. Pessoalidade: A prestação de serviços deve ser pessoal, significando que o trabalhador não pode se fazer substituir por outra pessoa. Isso indica que a execução do trabalho depende exclusivamente da figura do trabalhador, sendo um aspecto fundamental para distinguir a relação de emprego de outras modalidades de trabalho, como a prestação de serviços autônomos.
  2. Onerosidade: Este requisito indica que há pagamento de salário como contraprestação pelo trabalho realizado, caracterizando um vínculo econômico entre as partes. A onerosidade distingue o empregado de um trabalhador voluntário, que não recebe remuneração pelo trabalho executado.
  3. Não-eventualidade: Os serviços são prestados de forma não eventual e não esporádica, evidenciando a regularidade na execução das tarefas. Mesmo que o trabalho seja realizado em apenas um dia por semana, pode ser suficiente para caracterizar a não-eventualidade da prestação de serviços.
  4. Subordinação: Considerado o elemento central da relação de emprego, a subordinação refere-se ao estado de subordinação jurídica do trabalhador em relação ao empregador, acatando suas diretrizes específicas quanto à forma de prestação de serviços. O empregador, ao assumir os riscos da atividade econômica, detém o poder diretivo, disciplinar e fiscalizador, estabelecendo um vínculo hierárquico com o empregado.

Por outro lado, o artigo 2º da CLT, ao conceituar a figura do empregador, acrescenta o quinto elemento fático-jurídico da relação empregatícia:

  • trabalho prestado por pessoa física.

Veremos abaixo, a questão da pejotização e o princípio da primazia da realidade.

2. Pejotização e o Princípio da Primazia da Realidade

De acordo com os artigos 2º e 3º da CLT, exige-se o preenchimento simultâneo dos elementos da relação empregatícia para que esta seja reconhecida. Caso algum desses elementos esteja ausente, não haverá reconhecimento do vínculo empregatício.

Ocorre que, na tentativa de burlar os preceitos da legislação do trabalho, algumas empresas exigem a constituição de pessoa jurídica como condição necessária para a contratação (pejotização), mesmo quando presentes todos os demais elementos da relação empregatícia, como subordinação, controle de horários, exigência de atingimento de metas, etc.

Nesses casos, com base no princípio da primazia da realidade, o juiz do trabalho pode declarar o vínculo empregatício, com fundamento no artigo 9º da CLT, que dispõe: “serão nulos de pleno direito os atos praticados com o objetivo de desvirtuar, impedir ou fraudar a aplicação dos preceitos contidos na presente Consolidação”. Cabe citar as seguintes ementas:

PEJOTIZAÇÃO. ELEMENTOS DOS ARTS. 2º E 3º DA CLT. VÍNCULO EMPREGATÍCIO RECONHECIDO. O fato de o trabalhador ter prestado serviço, de forma pessoal, não eventual, onerosa e subordinada, para a reclamada, sob o véu de uma pessoa jurídica, mediante a emissão de notas fiscais em razão dos pagamentos que recebia, caracteriza a famigerada “pejotização” que objetiva fraudar a relação empregatícia por meio de artifícios meramente formais que não encontram abrigo no Direito do Trabalho, sobretudo em razão do princípio da primazia da realidade. Assim, presentes os elementos dos arts. 2º e 3º da CLT, impõe-se o reconhecimento do vínculo empregatício entre as partes. (TRT-9 – ROT: 00004884120205090013, Relator: EDUARDO MILLEO BARACAT, 24, Data de Publicação: 13/12/2021)

DANO MORAL. PEJOTIZAÇÃO. EXISTÊNCIA DE COAÇÃO. O fenômeno da pejotização caracteriza-se pela contratação de serviços pessoais, exercidos por pessoas físicas, de modo subordinado, não eventual e oneroso, realizada por meio de pessoa jurídica constituída unicamente para tal finalidade na tentativa de mascarar a relação de emprego e transmutá-la, aos olhos da lei, em prestação de serviço. A precarização dos direitos trabalhistas fere o direito ao pleno emprego ( CF, artigo 170, inciso VIII), o valor social do trabalho ( CF, artigo 1º, inciso VI), bem como, o patamar civilizatório mínimo de direitos sociais definidos pelos artigos 6º e 7º da Constituição Federal. Ao compelir o trabalhador a participar de uma pessoa jurídica como condição para sua permanência no emprego, resta configurada a coação e o cometimento de ato ilícito, gerando, assim, o dever de indenizar. Recurso da parte ré a que se nega provimento. (TRT-9 – ROT: 00002068020215090073, Relator: ELIAZER ANTONIO MEDEIROS, Data de Julgamento: 22/09/2022, 1ª Turma, Data de Publicação: 26/09/2022)

3. Pejotização e Decisões Recentes do STF em Reclamações Constitucionais

Como visto, a Justiça do Trabalho, com base no princípio da primazia da realidade, tem reiteradamente reconhecido o vínculo empregatício nas situações de contratação de pessoa jurídica em fraude aos preceitos trabalhistas (Art. 9º da CLT).

Ocorre que o Supremo Tribunal Federal (STF), no RE 958252 fixou a tese de repercussão geral, constante do tema 725:  

Tese: É lícita a terceirização ou qualquer outra forma de divisão do trabalho entre pessoas jurídicas distintas, independentemente do objeto social das empresas envolvidas, mantida a responsabilidade subsidiária da empresa contratante.

Embora o RE 958252 (leading case do Tema 725) tenha tratado apenas da “licitude da contratação de mão-de-obra terceirizada para serviços relacionados à atividade-fim da empresa”, a tese nele fixada tem sido estendida para validar a contratação por meio de pessoa jurídica. Com efeito, ao declarar lícita “qualquer outra forma de divisão do trabalho entre pessoas jurídicas distintas”, o Tema 725 do STF reacendeu o debate sobre a legalidade da pejotização, gerando diversas Reclamações Constitucionais no STF.

No entanto, é fundamental destacar o posicionamento do Ministro Luís Roberto Barroso no julgamento da Reclamação (Rcl) 56499. No voto, o Ministro enfatiza que a licitude da terceirização, incluindo a pejotização, está condicionada à ausência de fraude. Ele argumenta que:

“são lícitos, ainda que para a execução da atividade-fim da empresa, os contratos de terceirização de mão de obra, parceria, sociedade e de prestação de serviços por pessoa jurídica (pejotização), desde que o contrato seja real, isto é, que não haja relação de emprego com a empresa tomadora do serviço, com subordinação, horário para cumprir e outras obrigações típicas do contrato trabalhista.” Portanto, a validade dessa divisão de trabalho depende essencialmente da autenticidade do contrato e da inexistência de características que configuram um vínculo empregatício. (STF – Rcl: 56499 RJ, Relator: Min. LUÍS ROBERTO BARROSO, Data de Julgamento: 25/09/2023, Primeira Turma, Data de Publicação: PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG 18-10-2023 PUBLIC 19-10-2023 – grifos nossos)

Dessa forma, a despeito da tese fixada pelo STF no Tema 725 de repercussão geral, a Justiça do Trabalho deve continuar reconhecendo o vínculo empregatício nos casos em que ficar constatada a fraude na pejotização, mormente quando a pessoa jurídica é utilizada para mascarar a prestação de serviços sob os moldes empregatícios, em que o empregador exige a constituição de PJs para viabilizar a atividade remunerada, subordinada, não eventual e pessoal (Art. 3º da CLT).

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