Servidor do Ministério Público do Estado de São Paulo é preso por vazamento de dados ao PCC

Servidor do Ministério Público do Estado de São Paulo é preso por vazamento de dados ao PCC

Olá, pessoal. Aqui é o professor Allan Joos e hoje vamos analisar fatos relacionados a uma notícia que ganhou bastante notoriedade nos últimos dias: a divulgação de dados de acesso ao sistema do Tribunal de Justiça por um servidor do Estado de São Paulo ao PCC, possibilitando o acesso a informações sigilosas pela organização criminosa.

Segundo apuração do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), criminosos e advogados tiveram acesso à senha funcional de um servidor do Ministério Público do Estado de São Paulo (MPSP) para consultar processos judiciais sigilosos no sistema do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP).

Ao que consta, houve a identificação de mais de cem acessos indevidos. Os beneficiários seriam integrantes do Primeiro Comando da Capital – PCC. Ademais, dentre os objetivos do esquema estava a interferência de investigações do próprio MP e da Polícia Civil.

As investigações apuram não somente a conduta do servidor, mas também a eventual participação de advogados e de outros membros da organização criminosa. Na nossa análise jurídica, focaremos na conduta do servidor, na medida em que a temática é de extrema importância para o mundo dos concursos públicos.

Infrações penais supostamente praticadas pelo servidor

Na hipótese de comprovação dos fatos, a conduta do servidor público poderá, além das violações de âmbito administrativo, ser tipificada no crime de violação de sigilo funcional, na modalidade equiparada, prevista no art. 325, §1º, inciso I, do Código Penal.

O referido delito tem por objetivo punir o servidor que revela informações sigilosas do que tem ciência em razão do cargo. No caso em análise, a utilização da senha do servidor por terceiros, aparentemente cedida por ele, para acesso a dados protegidos judicialmente por pessoas não autorizadas constitui clara violação desse dispositivo, que tem previsão expressa sobre esse fornecimento.

Organização

Além disso, caso comprovado que o servidor aceitou ou solicitou vantagem indevida na troca de vazamento de informações, ele também responderá pelo crime de corrupção passiva (art. 317 do Código Penal).

Esse crime tem pena de reclusão de dois a doze anos, além de multa, podendo aumentar em um terço se houver prejuízo direto à Administração Pública. Note-se que a vantagem financeira obtida pelo servidor pode ser definida como o elemento central da corrupção passiva.

Caso comprovada a obstrução ou embaraço das investigações que envolvam a organização criminosa (PCC), o vazamento poderá ensejar também a tipificação do crime previsto no art. 2º, §1º, da Lei nº 12.850/2013. A pena é de três a oito anos de reclusão, além de multa.

Também a ligação do servidor com o Primeiro Comando da Capital, organização criminosa, poderá ainda ensejar a aplicação do art. 2º da mesma lei (integrar organização criminosa). A pena, nesse caso, varia de três a oito anos de reclusão. Ela pode ser agravada se a atuação do agente tiver sido determinante para o sucesso da organização.

Infrações funcionais/administrativas

No âmbito administrativo, as condutas descritas violam gravemente os princípios constitucionais da moralidade e da eficiência, previstos no art. 37 da Constituição Federal. A função pública exige do servidor um comportamento ético e comprometido com o interesse público, em fiel obediência a seus deveres e funções legalmente previstos.

Em seguida, a Lei nº 8.429/1992 (Lei de Improbidade Administrativa – LIA) poderá ensejar a responsabilização por ato doloso de improbidade administrativa.

O artigo 11 da citada lei tipifica como ato de improbidade a violação de sigilo de informações. As sanções incluem a perda da função pública, a suspensão dos direitos políticos por até oito anos e o ressarcimento integral dos danos ao erário, caso haja. No caso, certamente a frustração de diligências e investigações poderão ser considerados para aferição de eventual prejuízo.

Também, por envolver a prática de crime doloso, certamente será instaurado um processo administrativo disciplinar visando à apuração dos fatos e eventual aplicação de sanção disciplinar.

Assim, além da responsabilização penal, poderá o servidor responder por prática de ato de improbidade administrativa e também receber sanção disciplinar, na medida em que as esferas são distintas e independentes.

Observações finais

Os fatos narrados demonstram que, de fato, as facções criminosas já conseguiram se infiltrar no serviço público brasileiro.

No caso narrado, evidencia-se a participação de um servidor que integra os quadros funcionais do principal ator do combate à criminalidade organizada no nosso país, que é o Ministério Público, titular da ação penal pública incondicionada (art. 129, I, da CF/88).

A conduta do servidor público não compromete apenas os princípios fundamentais da Administração, mas também favorece diretamente a atuação de uma das organizações criminosas mais perigosas do Brasil.

No plano penal, os crimes de violação de sigilo funcional, corrupção passiva, interferência de Justiça e organização criminosa restarão configurados, caso comprovados os fatos. Além disso, a vinculação de integrantes do serviço público com o PCC agrava a situação, dada a relevância social e institucional do combate ao crime organizado.

Do ponto de vista administrativo, pode-se punir o servidor com a perda da função pública e outras avaliações previstas na Lei de Improbidade Administrativa. Já no âmbito da advocacia, os profissionais envolvidos enfrentaram o risco de avaliações disciplinares diversas pela OAB.

Portanto, para candidatos às carreiras jurídicas, o estudo do caso é um exemplo prático de como diferentes áreas do Direito convergem para tratar situações complexas envolvendo corrupção e criminalidade organizada. A análise demonstra a importância de princípios constitucionais, da aplicação rigorosa das normas penais e da atuação ética na proteção do interesse público.


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