Empresário Reage a Assalto em Ponta Grossa (PR) – Análise da Questão da Legítima Defesa e Outros Aspectos Penais e Processuais Penais

Empresário Reage a Assalto em Ponta Grossa (PR) – Análise da Questão da Legítima Defesa e Outros Aspectos Penais e Processuais Penais

A defesa legítima, uma das causas excludentes de ilicitude previstas no Código Penal brasileiro, encontra-se disposta no art. 23, inciso II, e especificamente no art. 25. O referido instituto jurídico autoriza o agente a repelir, de forma moderada, uma agressão injusta, atual ou iminente, contra direito seu ou de terceiros, sem que isso resulte em responsabilidade penal.

O caso

Na tarde de quinta-feira (13), às 14h35, em Ponta Grossa, Paraná (PR), ocorreu um episódio que exemplifica o uso da defesa legítima. Um empresário, proprietário de uma loja de celulares, reagiu a um assalto disparando cinco tiros contra o assaltante, que estava armado. O suspeito, ferido gravemente, foi internado. Uma câmera de segurança, instalada em um estabelecimento no bairro Uvaranas, registrou todo o incidente.

As imagens evidenciam que o assaltante, portando capacete, adentrou a loja e anunciou o roubo, sacando uma arma de sua calça e dirigindo-se à esposa do empresário. O empresário, que estava atrás de um balcão, reagiu prontamente, sacando sua própria arma e efetuando disparos contra o agressor.

Na minha concepção, como professor, o empresário empregou o meio menos lesivo ao seu alcance, interrompendo os disparos tão logo neutralizando devidamente a ameaça.

Conforme se depreende da leitura das diversas notícias que a mídia veiculou sobre o assunto, segundo o Delegado de Polícia Lucas Andraus, a Polícia Militar do Estado do Paraná e o Serviço Integrado de Atendimento ao Trauma em Emergência (Siate) receberam imediatamente o acionamento feito pelo irmão do empresário, também presente no local. O suspeito, de 23 anos, foi levado em estado grave ao Hospital Universitário da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG) e permanece sob custódia policial, aguardando transferência para a Cadeia Pública de Ponta Grossa após receber alta. Nenhuma outra pessoa feriu-se durante o incidente.

O empresário, de 29 anos, possuía uma arma registrada e legalmente mantida no estabelecimento. A conduta do empresário, conforme análise preliminar, foi considerada defesa legítima, em consonância com o art. 25 do Código Penal Brasileiro. Considerou-se a ação proporcional e necessária para repelir uma ação injusta, atual e iminente.

Legítima defesa

A legítima defesa constitui um dos mais primordiais e consagrados institutos de Direito Penal, encontrando respaldo tanto em ordenamentos jurídicos nacionais quanto internacionais. A doutrina e as exigências brasileiras delineiam seus contornos sob a égide de uma análise criteriosa dos elementos que a caracterizam, a saber: a agressão injusta, atual ou iminente, contra direito próprio ou alheio, e a utilização moderada dos meios necessários para repelir tal agressão.

Não que se trate de uma agressão injusta, faz-se necessário compreender que este deve configurar um ataque ou uma ameaça concreta e ilegítima, atentando contra a integridade física, o patrimônio, ou qualquer outro bem tutelado legalmente. Uma agressão pode ser tanto física quanto moral, visto que apresenta potencialidade lesiva capaz de justificar uma ocorrência defensiva.

Outros requisitos

A atualidade ou iminência da agressão é outro requisito que exige avaliação minuciosa. A ação atual é aquela que está em curso, exigindo resposta imediata por parte do agredido. A iminente, por sua vez, refere-se à atitude que está prestes a ocorrer, criando um estado de perigo imediato. A defesa contra agressão pretérita ou futura não encontra amparo no conceito de defesa, recaindo, eventualmente, em outras excludentes de ilicitude ou justificativas.

A proporcionalidade e a moderação no uso dos meios necessários para a defesa são igualmente imprescindíveis. A ocorrência deve ser proporcional à agressão sofrida, não podendo ultrapassar os limites do necessário para repelir o ataque. Aqui, a análise deve ser contextual, levando em consideração as situações do fato, as condições pessoais do agressor e do agredido, bem como o meio empregado na defesa. A utilização excessiva de força descaracteriza a defesa legítima, podendo ensejar responsabilidade penal ao defensor.

Ressalta-se ainda a relevância da defesa legítima putativa, onde o agente, embora residente sob erro, acredita estar em situação de defesa legítima. Esse erro, se escusável, pode excluir a culpabilidade, tendo em vista a ausência de dolo ou culpa consciente.

A prática judicial tem reconhecido a defesa legítima em diversas situações, desde conflitos interpessoais cotidianos até confrontos envolvendo agentes de segurança pública. A análise casuística é indispensável para garantir uma aplicação justa e equilibrada do instituto, sempre à luz dos princípios constitucionais e dos direitos fundamentais.

Em suma, a defesa legítima, como excludente de ilicitude, preserva o direito de autodefesa e a integridade dos bens jurídicos ameaçados, mantendo o equilíbrio entre a proteção individual e a ordem social. A doutrina oferece um arcabouço teórico robusto, que orienta a interpretação e aplicação desse instituto, essencial para a justiça penal contemporânea.

Sobre as apreensões

Armas de fogo

Ainda nas notícias, verifica-se que as armas de fogo envolvidas no cenário foram recolhidas para perícia. O assaltante portava um revólver calibre .38 com numeração raspada, enquanto a arma do empresário era uma com calibre 9mm, que será restituída após a conclusão do laudo pericial.

De acordo com o Estatuto do Desarmamento, permite-se a posse de arma de fogo desde que se cumpram os requisitos do art. 4º. Em regra, a posse pode ocorrer no domicílio, dependências ou local de trabalho do titular ou responsável legal, como no caso do empresário. O porte de arma de fogo é excepcional, conforme o art. 10 do mesmo diploma.

Em ocorrências policiais em que há o emprego de arma de fogo, quando houver apreensão da mesma, terá seu encaminhamento ao Instituto de Criminalística para exame de eficiência, conforme prevê o Estatuto do Desarmamento em seu art. 25.

Motocicleta

A motocicleta que o suspeito utilizou também sofreu apreensão e, provavelmente, passará por perícia. O art. 118 do Código de Processo Penal dispõe que as coisas apreendidas não poderão ser restituídas enquanto interessarem ao processo. No caso, a motocicleta restou apreendida na posse do indiciado quando da prática do delito de roubo pelo qual foi preso no inquérito policial em apreço.

Será cabível sua restituição desde que haja suficiente demonstração da propriedade e titularidade do direito sobre o bem.

Embora possa ter sido utiliza como instrumento do crime, se a tal moto não interessar ao julgamento da autoria e materialidade do delito, não pender qualquer perícia no interesse do feito nem estiver sujeito a perdimento, pois não consiste em coisa cujo fabrico, alienação, uso, porte ou detenção constitua fato ilícito, haverá ausência de fundamento, do ponto de vista processual penal, para manutenção da apreensão do bem. Lembrando que toda manutenção de bens apreendidos sem qualquer fundamentação gera custos desnecessários ao Poder Público.

Sobre os envolvidos

Autuou-se em flagrante o suspeito, que possui histórico de tráfico de drogas, por tentativa de roubo majorado pelo uso de arma de fogo. Se o indivíduo ostentar condenação por crime com trânsito em julgado, considera-se ele reincidente. Caso ele sofra a condenação, porém a sentença condenatória ainda caiba recurso, pode-se considerar ele tecnicamente primário.

empresário

Mesmo internado em estado grave, pelo que se depreende da leitura das notícias sobre o fato, o Delegado de Polícia lavrou o auto de prisão em flagrante.

Ainda pelo que se depreende da leitura das notícias, o empresário, sua esposa e seu irmão foram inquiridos, provavelmente no caderno investigatório instaurado a partir da prisão.

A investigação criminal transcorrerá no inquérito policial instaurado a partir do auto de prisão em flagrante, para determinar a possível participação de outros envolvidos no assalto.

O roubador permanecerá sob custódia da polícia, lembrando que a 5ª Turma do STJ entendeu no STJ – HC 509038 / RR 2019/0128803-5 que a não apresentação do flagranteado hospitalizado na referida audiência não tem o condão de tornar ilegal a prisão:

empresário

A título de esclarecimento, segundo o art. 310 do Código de Processo Penal, o Juiz, que exerce a judicatura na audiência de custódia, pode homologar o flagrante e assim conceder liberdade provisória ao indivíduo ou converter o flagrante em prisão preventiva. Se o juiz entender que a prisão é ilegal, poderá relaxar a prisão.

Análise

Com a Lei Anticrime, considera-se crime hediondo o roubo com emprego de arma de fogo tanto na forma tentada quanto consumada.

O Superior Tribunal de Justiça, por meio da Súmula 668, entende que “não é hediondo o delito de porte ou posse de arma de fogo de uso permitido, ainda que com numeração, marca ou qualquer outro sinal de identificação de raspado, suprimido ou adulterado”. Além disso, a 5ª Turma do STJ entende que o roubo absorve o crime de porte de arma quando se evidencia o nexo de dependência ou de subordinação entre as duas condutas e que os delitos ocorreram em um mesmo contexto fático, o que caracteriza o princípio da consunção.

O local do crime, a loja, passaram pelo isolamento e pela perícia, em conformidade com o art. 6º do Código de Processo Penal, procedimento essencial para a preservação das provas e a condução adequada da investigação.

Assim como a Polícia Civil e a Polícia Militar, recomendo que as vítimas de assalto não reajam e acionem as autoridades, fornecendo detalhes sobre o suspeito e o local do crime.

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