Solução da Banca

Para a pontuação da questão dissertativa, foram considerados os seguintes critérios:

A correção da linguagem, o domínio técnico dos temas, o poder de síntese, o desenvolvimento claro, coerente e lógico das respostas, com indicação dos dispositivos legais pertinentes, com eventual citação de doutrina e jurisprudência.

A teoria do domínio do fato, que foi desenvolvida, sobretudo por autores alemães (Welzel, Roxin etc.), é uma teoria eclética que combina elementos objetivos e subjetivos, formais e materiais, e considera o autor a figura central do fato típico. É autor quem, nos crimes comissivos e dolosos, realiza a ação típica, pessoalmente, ou valendo-se de terceiro como instrumento. No primeiro caso, há autoria direta ou de mão própria (domínio da ação); no segundo, autoria indireta ou mediata (domínio da vontade).

Na autoria mediata há um domínio da vontade do executor sobre o autor mediato, que incide em erro ou sofre coação física ou moral etc. (v.g., o médico usa a enfermeira para matar o paciente, sem que ela o saiba). Nesse caso, somente o autor mediato é punível (o médico). Haveria coautoria (domínio funcional) se ambos agissem dolosamente.*

O coautor é um autor; a coautoria é uma forma de autoria. Aqui há domínio funcional do fato, que se realiza por meio da divisão de tarefas entre os coautores durante a execução do crime (v.g., no roubo, um agente aponta a arma contra a vítima enquanto o outro subtrai valores). Somente é coautor quem participa da execução do delito.

Por sua vez, a participação, que se expressa por meio de instigação, induzimento ou cumplicidade (auxílio moral ou material), é acessória relativamente à autoria. O partícipe não é um autor, logo, não é um coautor, razão pela qual não intervém nos atos de execução. Não há domínio do fato por parte do partícipe. Apesar disso, o partícipe pode ser apenado mais duramente do que o autor ou coautor, segundo as circunstâncias do caso.

Em geral, especialmente Claus Roxin, entende-se que a teoria do domínio do fato não é aplicável aos crimes culposos e omissivos, mas somente aos crimes comuns, comissivos e dolosos. É que naqueles não há domínio do fato, mas infração de dever. (Roxin, Claus. Autoría y domínio del hecho em derecho penal. Madrid: Marcial Pons, 2016).

O Código Penal adotou não a teoria do domínio do fato, mas a teoria monista/unitária (CP, art. 29), que trabalha com um conceito extensivo de autor, e não faz distinção entre autoria, coautoria e participação, pois considera que todos que tomam parte num crime são autores desse crime. Apesar disso, a teoria do domínio do fato, que trabalha com um conceito restritivo de autor, é perfeitamente compatível com o CP, já tendo sido admitida pelo STF e STJ inclusive.

A autoria mediata por domínio de aparato organizado de poder é um conceito criado por Roxin. Trata-se de uma nova modalidade de autoria mediata, cuja particularidade reside no fato de que, ao contrário do conceito tradicional, autor mediato e imediato são igualmente culpáveis e puníveis. Aqui o autor mediato se vale de um aparato de poder para o cometimento de crimes, sendo que os executores são fungíveis ou substituíveis (v.g., execuções ordenadas por uma estrutura mafiosa).

*Obs: a banca publicou espelho com conceito de autoria mediata diverso do que consta na doutrina.

Segundo a doutrina, na autoria mediata temos dois sujeitos, o autor mediato e o executor. Na autoria mediata o autor mediato se utiliza de um executor para a prática do crime, sendo este um instrumento para tanto.

O autor mediato não pratica atos executórios, ele tão somente determina que o autor imediato os pratique, esse seu jeito é quem responderá penalmente (autor mediato).

Solução do Professor

Na autoria indireta ou mediata, o agente se vale de outra pessoa, que lhe serve, na verdade, como instrumento para a prática da infração penal. Para que se possa falar em autoria indireta ou mediata, será preciso que o agente detenha o controle da situação, isto é, que tenha o domínio do fato.

A propósito, percebe-se que o nosso Código Penal não traçou a diferença entre autor e partícipe, daí por que coube à doutrina essa missão, apresentando-se três vertentes, entre elas a teoria do domínio do fato:

Teoria do domínio do fato (teoria objetivo-subjetiva): segundo a qual autor é aquele que tem domínio final sobre o fato. É aquele que tem o poder de decisão sobre a realização do fato, ou seja, é “o senhor do fato”, nas palavras do ilustre penalista alemão Hans Welzel.

Essa teoria tem aplicação apenas nos crimes dolosos, pois somente nestes é que se pode admitir o controle finalístico sobre o fato criminoso, já que os delitos culposos se caracterizam exatamente pela provocação de um resultado involuntário, e, consequentemente, impossível de ser dominado finalisticamente. Também não se aplica aos crimes omissivos, pois o resultado acontece em virtude de uma abstenção do agente, portanto, visto que, o omitente não domina a vontade de terceiro, somente descumpre sua obrigação pessoal de agir e impedir o resultado.

Merece ser destacado que o Código Penal brasileiro se perfilha à teoria restritiva da autoria, atrelada à teoria objetivo-formal, distinguindo autor de partícipe. Nada obstante, a teoria do domínio do fato vem angariando a preferência da doutrina e de parcela da jurisprudência pátria, não sendo incomum encontrar seus postulados acolhidos em diversas decisões dos nossos tribunais.

Por fim, quanto à autoria por domínio de aparato organizado de poder, cuida-se de figura criada por Claus Roxin, tratando-se de uma espécie diversa de autoria, porque aqui autor mediato e imediato (homem de trás e executor) são igualmente culpáveis e puníveis. Além disso, não seria o caso de coautoria, quer porque o executor é uma figura anônima e substituível (fungível), quer porque não há, em geral, acordo prévio e preciso entre mandantes e mandatários, que, com frequência, sequer se conhecem (conforme lições de Paulo Queiroz).