O fim do Homo sapiens
No início do século XXI, o Homo sapiens está transcendendo seu limites determinados biologicamente. Está começando a violar as leis da seleção natural, substituindo-as pelas leis do design inteligente.
Durante quase quatro bilhões de anos, cada organismo do planeta evoluiu submetido à seleção natural. Hoje, o regime de seleção natural está enfrentando um desafio completamente diferente. Em laboratórios no mundo inteiro, cientistas estão criando seres vivos. Eles violam as leis da seleção natural impunemente, sem se deixar frear nem mesmo pelas características originais de um organismo. Eduardo Kac, um bioartista brasileiro, decidiu, em 2000, criar uma nova obra de arte: uma coelha verde fluorescente. Kac contatou um laboratório francês e ofereceu um pagamento para que eles fabricassem uma coelha radiante de acordo com suas especificações. Os cientistas franceses pegaram um embrião de coelha branca comum, implantaram em seu DNA um gene tirado de uma água-viva verde fluorescente e voilá! Uma coelha verde fluorescente para le monsieur. Kac batizou a coelha de Alba.
É impossível explicar a existência de Alba pelas leis da seleção natural. Ela é produto de design inteligente. É também uma precursora do que está por vir. Se o potencial que Alba significa for plenamente realizado – e se a humanidade não aniquilar a si mesma até lá –, a Revolução Científica pode se mostrar muito maior do que uma mera revolução histórica. Pode se revelar a mais importante revolução biológica desde o surgimento da vida na Terra. Depois de quatro bilhões de anos de seleção natural, Alba se encontra no amanhecer de uma nova era cósmica, em que a vida será governada por design inteligente. Se isso acontecer, toda a história humana até esse ponto pode, em retrospectiva, ser reinterpretada como um processo de experimentação e aprendizado que revolucionou o jogo da vida. Tal processo deve ser entendido de uma perspectiva cósmica de bilhões de anos, e não de uma perspectiva humana de milênios.
Biólogos do mundo inteiro estão em embate com os defensores do design inteligente, que se opõem ao ensino da evolução darwinista em escolas e afirmam que a complexidade biológica prova que deve haver um criador que concebeu todos os detalhes biológicos de antemão.
HARARI, Y. N. Sapiens: uma breve história da humanidade. 48 ed. Trad. de J. Marcoantonio. Porto Alegre, RS: L&PM, 2019. p. 408-410. Adaptado.
A revolução da biotecnologia: questões da sociabilidade
A biologia agora é uma ciência exata.
A vida não é um mistério, é só um processo
complexo, que está começando
a ser totalmente definido.
(Andrew Simpson)
Durante quase todo o século XX a física foi considerada a mais poderosa das ciências. No final desse mesmo século a biologia assume esse caráter. Os recentes avanços da genética molecular no conhecimento da composição, estrutura e funcionamento dos organismos vivos impõem instigantes questões. A firme crença na correlação entre características e genes correspondentes e na capacidade da biotecnologia nos leva a pensar que estamos vivenciando o início de uma revolução que sinaliza que a humanidade não mais necessitará se sujeitar aos fatores de caráter aleatório que marcaram a história. Existe agora a possibilidade de transformar e controlar de acordo com desígnios bem definidos a natureza em seu núcleo elementar. As fronteiras entre a ficção e a realidade científica parecem cada vez mais tênues.
Um intenso debate começa a se projetar na vida cotidiana, para fora das academias, dos gabinetes políticos e das sedes das grandes corporações. No momento quando a terapia genética e a alimentação com vegetais geneticamente modificados já são realidade, cabe perguntar pelos fundamentos lógicos que delimitam os alvos teóricos/práticos, as hipóteses e os resultados das modernas pesquisas genéticas; cabe perguntar sobre os valores éticos e culturais que orientam tais pesquisas e, sobretudo, os impactos objetivos pela difusão da biotecnologia. Embora essas questões permaneçam obscuras, tamanha é a força com a qual a genética molecular se assume no imaginário coletivo, que as ciências sociais recebem o convite, quase um ultimato, para participarem de uma aventura intelectual baseada em premissas biológicas.
VICTORINO, V. I. P. A revolução da biotecnologia: questões da sociabilidade. Tempo soc., São Paulo, v. 12, n. 2, p. 129-145, Nov. 2000. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_ arttext&pid=S0103-20702000000200010&lng=en&nrm=iso. Acesso em 24/jan/2020. [Adaptado]
Analise as afirmativas abaixo com base nos textos 1 e 2.
1. Ambos os textos mencionam a existência de um debate envolvendo a biotecnologia, seja entre biólogos e defensores do design inteligente (texto 1), seja na comunidade em geral (texto 2).
2. Os textos compartilham uma perspectiva histórica sobre os estudos envolvendo a vida, e uma demanda por reflexão sobre os efeitos futuros da biotecnologia.
3. Ambos os textos abordam os efeitos da alimentação com produtos geneticamente modificados na vida humana.
4. Em “É impossível explicar a existência de Alba pelas leis da seleção natural” (texto 1), e “cabe perguntar sobre os valores éticos e culturais que orientam tais pesquisas” (texto 2), é possível identificar perguntas retóricas que aproximam o leitor do autor.
5. O design inteligente e a genética molecular são aventuras intelectuais sem efeitos práticos e passíveis de medição.
Assinale a alternativa que indica todas as afirmativas corretas.