Questão
2015
FCC (DISCURSIVAS)
Tribunal de Justiça de Goiás
Juiz de Direito
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Peça
A empresa Laboratório Saraja Eireli, pessoa jurídica de direito privado, com sede no Distrito Agroindustrial de Anápolis "DAIA" - na cidade de Anápolis-GO, com capital integralizado de R$ 3.000.000,00, representada por seu proprietário Georges dos Remédios, brasileiro, casado, empresário do ramo farmacêutico, domiciliado e residente na cidade de Anápolis, juntamente com seu representante, agindo como pessoa física, em litisconsórcio ativo facultativo, manejaram, perante uma das Varas Cíveis da Comarca de Anápolis, uma ação que intitulou de "Revisional Ordinária Cumulada com Consignatória e Outras Providências", em desfavor de Banco Itadesco S/A., que tem sede na cidade de São Paulo, todos devidamente qualificados.

Em sua petição inicial, a empresa Laboratórios Sarajá afirma que se trata de empresa sólida no mercado, detentora de diversas marcas de medicamentos tido como referência e apego popular, concedendo emprego para mais de 3000 pessoas, e, em face de tal sucesso, resolveu ampliar suas atividades, expandindo seu parque industrial, e investindo em rede de distribuição de medicamentos, o que a descapitalizou momentaneamente, fazendo surgir a necessidade de buscar no mercado financeiro dinheiro novo. Dizendo-se vítima da poderosa e sufocante campanha publicitária divulgada pelo Banco Itadesco S/A, primeiro requerido, nos meios de comunicação social, especialmente pelas peças publicitárias divulgadas pela segunda requerida, Rede Bobo de Televisão, (a qual assiste todos os dias, o dia todo) com a utilização da imagem do terceiro requerido, Ronaldo Adiposo, atleta de grande renome no país e no exterior, acabou sendo atraído pelo "canto da sereia", induzido a contrair empréstimo no importe de R$ 3.300.000,00 (três milhões e trezentos mil reais), na modalidade "capital de giro light", como o prazo de 3 anos para liquidar o total, dividindo em parcelas mensais, com a taxa de juros prometida e pactuada de 2,0% ao mês, e a previsão de cobrança de comissão de permanência, correção monetária, juros de mora e elevação dos juros remuneratórios em caso de inadimplência, para 5% ao mês, além de multa em importe equivalente a 10% sobre o valor devido. Diz que as cláusulas do contrato são abusivas e extremamente desfavoráveis a si, em razão do que pretende se ver livre do contrato o quanto antes, querendo inclusive pagá-lo antecipadamente, desde que lhe seja concedido um justo desconto, e que lhe sejam cobrados apenas dos juros legais. Afirma, ainda, estar pagando as prestações regularmente, com exceção da parcela vencida em março de 2014, que não foi adimplida a tempo, ensejando a inscrição de seu nome em banco de dados de consumo, o que, a seu ver, não pode prevalecer, uma vez que, de 36 parcelas pactuadas, pagou regularmente 21, ficando apenas uma sem pagamento, estando, aliás, a pagar todos os meses subsequentes até a presente data.

Georges dos Remédios, enquanto pessoa física, alega que, necessitando de dinheiro para sua empresa (a primeira requerente), e influenciado pela campanha publicitária enganosa desenvolvida pelo Banco, utilizando-se do veículo de comunicação mencionado e da figura festejado de "Ronaldo Gordinho", como é conhecido o terceiro requerido, foi atraído, senão compelido, a ali buscar empréstimo. Assevera que, além de se tratar de dinheiro mais caro que na concorrência, ainda foi vítima da conduta do gerente do estabelecimento bancário, que condicionou a liberação do empréstimo a aquisição de um seguro de vida e acidentes pessoais no valor de R$ 1.000,00 ao mês, e um título de capitalização no valor de R$ 1.500,00 ao mês, que, em virtude de sua urgência, teve os instrumentos de aquisição prontamente assinado de, com previsão de pagamento mensal via carnê, que mediatamente lhe foi entregue. Como não queria participar de plano de seguro de vida ou de capitalização, nunca pagou nenhuma das parcelas, passando a acreditar que os documentos assinados nada valiam, permanecendo o banco em silêncio. Ocorre que, em novembro de 2014, ocorrendo o atraso de uma das mensalidades do empréstimo feito a empresa, o banco somou o valor de todas as parcelas do seguro e do título de capitalização vencidas até aquela data, acrescentou correção monetária e juros e debitou de uma só vez, os valores na conta corrente pessoal de Georges, o que consumiu todo o saldo existente, provocando, de outro lado, devolução de dois cheques que havia emitido, um em uma padaria, no valor de R$ 100,00, e outro relativo à aquisição de uma televisão, no importe de R$ 1.500,00. Isso não só o deixou como mau pagador perante as pessoas com as quais negociou, como encerrou a inscrição de seu nome no CCF e na SERASA, bancos de dados de consumo. Diz haver experimentado prejuízo moral, e, bem assim, ser entendida a cobrança de valores relativos a contratos já extintos, sem nenhuma autorização para débito em conta corrente. Invocando dispositivos do Código de Defesa do Consumidor, os autores pedem:

a - nos moldes do § 2º do artigo 52 do CDC, a determinação de que o banco primeiro requerido receber antecipadamente o saldo restante do contrato, calculando com base em juros mensais a razão de 1%, sob pena de multa diária.

b - a revisão do contrato de financiamento concedido a empresa, para que seja remunerado apenas com a taxa de juros de 12% ao ano, de acordo com o Decreto 22626/33, abatendo-se do total o que já foi pago em excesso, e, nos moldes do parágrafo único do artigo 25 da lei 8078/90, a devolução em dobro de tudo que foi pago em excesso.

c - a revisão do contrato para impedimento de cobrança de comissão de permanência, por ser abusiva, e, bem assim, a sua cumulação com juros e correção monetária, e multa, e, ainda a redução da multa por inadimplência ao patamar de 2%, como determina o CDC.

d - a retirada do nome da empresa dos bancos de dados respectivos, tendo em vista já haver pago mais do que o devido, não sendo justa a manutenção da restrição em virtude de um único mês de atraso.

Em relação ao autor Georges, pede:

a - o reconhecimento da inexistência dos contratos entabulados, uma vez que obtidos de forma ilícita, pedindo antecipação dos efeitos da tutela para que cessem os descontos em sua conta corrente, relativos ao seguro e ao título de capitalização.

b - que as importâncias indevidamente sacadas de sua conta sejam objeto de devolução em dobro, como repetição do indébito, com os acréscimos legais;

c - que haja condenação ao pagamento de indenização por danos morais em virtude dos fatos acima narrados, em importe nunca inferior a R$ 200.000,00, para pessoa física, e R$ 500.000,00, para a pessoa jurídica;

d - a condenação ao pagamento em lucros cessantes, visto que, em virtude da inscrição indevida do nome de pessoa física e jurídica em banco de dados, experimentou prejuízos diversos, deixando, por exemplo, antes de exportar remédios para China e de vender ao governo Brasileiro;

e - em virtude da previsão contida nos artigos 7º, parágrafo único, 12, 25, § 1º, e 34 do CDC, que a condenação seja solidária entre os requeridos, e, de qualquer forma, concorreram para os prejuízos sofridos, dando a causa o valor de R$ 1.000,00 juntando documentos.

Citados (1º, 2º e 3º requeridos) respectivamente em 5, 7 e 12 de maio do ano de 2015, com A.R.s juntados aos autos em 1 de junho de 2015, o primeiro requerido apresentou contestação em 12 de junho de 2015, fazendo as seguintes alegações como preliminares:

1 - incompetência do juízo, tendo em vista se tratar de direito pessoal, que clama pela propositura da ação no foro do domicílio do réu, ou, na pior das hipóteses de, no foro da Comarca de Goiânia, onde mantém agência e fora assinado o contrato respectivo.

2 - impugnação ao valor da causa, tendo em vista que, nos moldes do artigo 259, V, do CPC, a causa deveria ser o valor do contrato objeto de discussão.

3 - impossibilidade jurídica do pedido. O primeiro requerente, tendo em vista estar este se baseando exclusivamente nas disposições do CDC, que não pode ser aplicada ao caso, por inexistir em três partes relação de consumo.

4 - inépcia da petição inicial, tendo em vista a impossibilidade de existência do litisconsórcio formado, sendo os pedidos distintos e a causa de pedir remota distintos, bem como as partes não idênticas.

Meritoriamente, reafirma não poder a empresa ser considerada consumidora, não sendo necessária a utilização dos dispositivos do CDC para equiparação de forças, por se tratar de empresa sólida, bem preparada e acostumada ao mundo dos negócios, dando-se inclusive a exportação. Aduz que, sendo o contrato regido pelo Código Civil, deve prevalecer o que foi pactuado entre as partes, não havendo nenhuma ilegalidade nas cláusulas firmadas, assegurando não existir possibilidade de reparação de danos morais pela falta de seus requisitos, mesmo porque estava em exercício regular de um direito ao promover a inscrição do nome da empresa inadimplente em banco de dados.

Quanto ao pedido de Georges, enquanto pessoa física prossegue afirmando não existir nenhuma irregularidade nos contratos celebrados entre as partes, relativos à seguro e plano de capitalização, tendo em vista que foram assinados livremente pelo autor, após exame minucioso. Diz também ter agido em exercício regular do direito ao cobrar as parcelas de uma só vez, tendo em vista que o contrato celebrado entre as partes não mencionava qual deveria ser a forma de cobrança, deixando ao talante do banco a escolha do meio de promover a cobrança, mesmo tendo entregado o carnê para o autor, não acusando o recebimento das parcelas, cobrou-as por meio de débito em conta corrente. Diz que se os cheques do autor voltaram, o único responsável por isso é ele mesmo, que não cuidou de deixar saldo suficiente para sua compensação, devendo ser típico caso da "indústria de danos morais", e, batendo-se pela improcedência total da ação, encerrar sua peça apresentando pedido contraposto para que o juiz condene a empresa autora ao pagamento da parcela em atraso do financiamento, juntando documentos.

Já a segunda ré, Rede Bobo de Televisão, apresenta contestação no dia 6 de julho, onde se bate exclusivamente pela sua ilegitimidade para figurar no polo passivo da ação, tendo em vista não haver participado, em nenhum momento, da celebração do contrato entre as partes, assevera que nem mesmo contato algum teve com o banco primeiro requerido, uma vez que fez divulgar a peça publicitária por meio da Agência de Publicidade Vende Tudo, não tendo praticado nenhum ato que atente contra a moral de qualquer das partes, batendo-se pela sua exclusão do polo passivo da lide, ou, em caso contrário, pela improcedência do pedido inicial, e, em caso de procedência, parcimônia na fixação do valor da condenação.

Por derradeiro, Ronaldo Adiposo compareceu desacompanhado de advogado aos autos, apresentando missiva por ele assinada, no dia 15 de junho de 2015, afirmando que seu negócio era praticar esportes, e que somente recebeu o cachê para participar da campanha publicitária, o que foi parte dos salários que recebeu ao atuar no Goiânia Esportes Clube.

Os autores replicaram as contestações, dizendo-as intempestivas, reafirmando os termos da inicial, e, instados a especificarem as provas que pretendem produzir, autores pediram o julgamento antecipado da lide, enquanto os demais mantiveram silentes.

Como juiz substituto lotado na Comarca de Anápolis-GO, dê a correta solução ao processo, com observância das prescrições legais e jurisprudenciais respectivas.