Leia fragmentos de “Morte e Vida Severina “de João Cabral de Melo Neto abaixo e responda às questões:
MORTE E VIDA SEVERINA
(AUTO DE NATAL PERNAMBUCANO)
PRIMEIRO FRAGMENTO
O RETIRANTE EXPLICA AO LEITOR QUEM É E A QUE VAI
(...)
— O meu nome é Severino, como não tenho outro de pia. (...)
Somos muitos Severinos
iguais em tudo na vida:
na mesma cabeça grande
que a custo é que se equilibra,
no mesmo ventre crescido
sobre as mesmas pernas finas,
e iguais também porque o sangue que usamos tem pouca tinta.
E se somos Severinos
iguais em tudo na vida, morremos de morte igual, mesma morte severina:
que é a morte de que se morre
de velhice antes dos trinta,
de emboscada antes dos vinte, de fome um pouco por dia
(de fraqueza e de doença
é que a morte severina
ataca em qualquer idade,
e até gente não nascida).
Somos muitos Severinos
iguais em tudo e na sina:
a de abrandar estas pedras suando-se muito em cima,
a de tentar despertar
terra sempre mais extinta,
a de querer arrancar
algum roçado da cinza.
Mas, para que me conheçam melhor Vossas Senhorias
e melhor possam seguir
a história de minha vida,
passo a ser o Severino
que em vossa presença emigra. (...)
SEGUNDO FRAGMENTO
— Seu José, mestre carpina, que habita este lamaçal, sabes me dizer se o rio
a esta altura dá vau?
sabe me dizer se é funda esta água grossa e carnal?
— Severino, retirante,
jamais o cruzei a nado; quando a maré está cheia vejo passar muitos barcos, barcaças, alvarengas,
muitas de grande calado.
— Seu José, mestre carpina, para cobrir corpo de homem não é preciso muito água: basta que chega ao abdome, basta que tenha fundura igual à de sua fome.
(...)
— Severino, retirante,
o meu amigo é bem moço; sei que a miséria é mar largo, não é como qualquer poço: mas sei que para cruzá-la vale bem qualquer esforço.
— Seu José, mestre carpina, e quando é fundo o perau? quando a força que morreu nem tem onde se enterrar, por que ao puxão das águas não é melhor se entregar?
— Severino, retirante,
o mar de nossa conversa precisa ser combatido, sempre, de qualquer maneira, porque senão ele alaga
e devasta a terra inteira.
— Seu José, mestre carpina, e em que nos faz diferença que como frieira se alastre, ou como rio na cheia,
se acabamos naufragados num braço do mar miséria?
— Severino, retirante,
muita diferença faz
entre lutar com as mãos
e abandoná-las para trás, porque ao menos esse mar não pode adiantar-se mais. (...)
— Seu José, mestre carpina, que diferença faria
se em vez de continuar tomasse a melhor saída:
a de saltar, numa noite,
fora da ponte e da vida?
(...)
Severino e o mestre Carpina possui visões diferentes a respeito da vida no segundo fragmento. Identifique a alternativa incorreta: