A alternativa correta é a letra E.

e) responderá por um crime de homicídio.

As demais alternativas, pelo mesmo fundamento a seguir, ficam afastadas.

A questão exige conhecimento dos princípios utilizados na solução do conflito aparente de normas. No caso em tela, João responderá por um único crime de homicídio consumado, não havendo que se falar em concurso de crimes.

O crime de homicídio (art. 121, CP) é um crime plurissubsistente, podendo, portanto, ser praticado através de um ou de vários atos de execução, admitindo o fracionamento do iter criminis. Assim, apesar de a conduta praticada por João (matar alguém) ter sido fracionada em 20 atos de execução (golpes de faca), o crime permanece único. É o que a doutrina classifica como crime progressivo.

Vejamos brevemente um resumo dos princípios utilizados para a solução do conflito aparente de normas.

PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO OU ABSORÇÃO (Lex consumens derogat consumptae)

Esse princípio propõe que o fato mais amplo e mais grave absorve outros fatos menos amplos e menos graves que funcionam como fase normal de preparação, execução ou mero exaurimento do crime.

O princípio da consunção trata-se de um gênero que abrange três espécies:

a) Crime Progressivo: ocorre quando o agente, objetivando, desde o início, produzir o resultado mais grave, pratica, por meio de atos sucessivos, crescentes violações ao bem jurídico, sendo estes meios naturais e necessários para a consumação do crime fim. O último ato, causador do resultado pretendido, absorve todos os anteriores, que acarretaram violações em menor grau. Dessa forma, o agente responde pelo resultado mais grave (é este o princípio aplicável ao caso apresentado pelo enunciado).

b) Progressão Criminosa: o agente inicialmente deseja produzir um resultado e, após atingi-lo, decide prosseguir na sua agressão, produzindo uma lesão mais grave. A distinção do crime progressivo é que, enquanto neste, há unidade de desígnios (ou seja, o agente visa, desde o início, produzir o crime mais grave), na progressão criminosa há pluralidade de elemento subjetivo ou vontade. Ex.: O agente tortura a vítima a fim de obter informações e, em seguida, decide matá-la. Também nesse caso, responderá somente pelo homicídio.

c) Post factum impunível (fato posterior impunível): ocorre quando, após a consumação do delito, o agente pratica novo ataque contra o mesmo bem jurídico, apenas para tirar proveito da prática anterior. Ex.: Após o furto, o agente destrói ou vende a coisa. Por não haver nova lesão ao bem jurídico (a lesão já havia sido configurada no furto), não há que se punir o dano ou a receptação qualificada, sendo qualquer um destes mero exaurimento.

PRINCÍPIO DA ESPECIALIDADE (Lex specialis derogat generali)

Pelo princípio da especialidade, a incidência do tipo especial afasta a incidência do tipo geral (ou a lei especial afasta a geral). Lei especial é aquela que contém todos os requisitos da lei geral e mais alguns, chamados especializantes.

Ex.: Homicídio (121, CP) e Infanticídio (123, CP) – no infanticídio, o crime de matar alguém (homicídio) possui elementos especializantes que determinam o crime. Sendo assim, a mãe que mata, sob a influência do estado puerperal, o próprio filho, durante o parto ou logo após, não comete homicídio, mas, sim, infanticídio, pelo princípio da especialidade.

O princípio da especialidade está previsto no art. 12 do Código Penal:

Legislação especial

Art. 12 - As regras gerais deste Código aplicam-se aos fatos incriminados por lei especial, se esta não dispuser de modo diverso.

PRINCÍPIO DA SUBSIDIARIEDADE (Lex primaria derogat subsidiariae)

O princípio da subsidiariedade apresenta-se quando da prática de uma conduta inicial faz surgir uma norma incriminadora que, pela gravidade da atuação do agente, passa a configurar um outro crime. Nesse caso, a norma mais ampla engloba a norma mais específica.

A norma subsidiária, portanto, descreve um grau menor de violação de um mesmo bem jurídico, ou seja, a norma que descreve o “todo” absorve a norma que descreve apenas "uma parte" (a subsidiária), tendo em vista que esta “cabe” naquela. A norma primária não é especial, é mais ampla.

Ex.: O crime de ameaça (art. 147, CP) cabe no de constrangimento ilegal (art. 146, CP), o qual, por sua vez, cabe dentro da extorsão (art. 158, CP). Perceba que só se aplica esse princípio quando a norma principal for mais grave que a subsidiária. Para saber qual norma incidirá, é necessário verificar qual crime foi praticado e qual foi a intenção do agente.

Portanto, para aplicação do princípio da subsidiariedade, é imprescindível a análise do caso concreto, sendo insuficiente a comparação abstrata dos tipos penais.

A subsidiariedade se divide, ainda, em expressa (ou explícita) e tácita (ou implícita):

Subsidiariedade expressa ou explícita: a própria norma reconhece expressamente seu caráter subsidiário, admitindo incidir somente se não ficar caracterizado fato de maior gravidade. Ex.: Ao definir a lesão corporal seguida de morte, o art. 129, § 3º, CP, afirma incidir se “as circunstâncias evidenciam que o agente não quis o resultado, nem assumiu o risco de produzi-lo”;

Subsidiariedade tácita ou implícita: a norma nada diz, mas, diante do caso concreto, por meio da interpretação sistemática, verifica-se sua subsidiariedade. Ex.: mediante uso de ameaça, o autor subtrai a carteira da vítima. Incidem, aparentemente, o tipo definidor do roubo (norma primária) e o da ameaça (norma subsidiária). Assim, sem que a lei nada diga, prevalece o primeiro (roubo).

PRINCÍPIO DA ALTERNATIVIDADE

O princípio da alternatividade é, na verdade, um princípio aplicável ao conflito dentro de uma mesma norma, e não entre normas diferentes.

Nos crimes plurinucleares, também chamados de crimes de ação múltipla ou de conteúdo variado, o tipo penal descreve várias condutas no mesmo artigo, ou seja, contém vários verbos como núcleos do tipo, de modo que, pelo princípio da alternatividade, se o agente praticar mais de um ato, no mesmo contexto fático, configurará a incidência de um único crime.

Ex.: art. 33, caput, da lei de Drogas (Lei 11.343/2006)

Art. 33. Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar:

Pena - reclusão de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos e pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa.