Solução do Professor

RELATÓRIO

Cuida-se a ação penal promovida pelo Ministério Público contra três réus, já qualificados, denunciados por:

organização criminosa armada, com a participação de adolescentes e com conexões (art. 2º, §§ 2º, 3º e 4º, I e IV da Lei 12.850/13);

tortura mediante sequestro (art. 1º, I, ‘a’ c/c § 4º, III da Lei 9.455/97);

porte ilegal de arma de fogo de uso restrito (art. 16 da Lei 10.826/03) e

corrupção de menor (art. 244-B da Lei 8.069/90);

crime de trânsito, consistente em entregar ou permitir a direção de veículo automotor a pessoa não habilitada (art. 310 da Lei 9.503/97).

Os acusados foram presos em flagrante próprio, em 02/10/2021, na sequência submetidos à audiência de custódia, ato no qual além de se analisar quanto à prisão e medidas cautelares, foram adotadas as providências necessárias e compatíveis com a situação particular de cada indivíduo capturado, nos termos do art. 310 do CPP.

A denúncia foi recebida (adotando-se rito ordinário - art. 22 da Lei 12.850/13) e os acusados foram citados pessoalmente, apresentando respostas à acusação (art. 396-A do CPP) por defensores nomeados, com exceção de Alex Alisson que contratou advogado para que o representasse.

Após réplica do Ministério Público, designou-se audiência de instrução e julgamento para o início do mês de fevereiro de 2022, ocorrida em ato único e por meio audiovisual, oportunidade em que se ouviu o ofendido, as testemunhas indicadas pelo Ministério Público e pela defesa, interrogando-se os acusados.

Ao final da audiência de instrução e julgamento, houve pedido de diligências complementares, por parte da defesa de Otávio Oliva, como faculta o art. 402 do CPP.

Em alegações finais por memoriais (dada a complexidade do caso e o número de acusados – art. 403, § 2º do CPP), o Ministério Público, rechaçando preliminares, requereu a condenação de todos os acusados pelos crimes praticados em razão dos fatos narrados na denúncia.

As defesas técnicas dos três acusados apresentaram memoriais, não só trazendo questões antecedentes/preliminares, como também postulando pela absolvição. Sucintamente relatado o procedimento, DECIDO.

FUNDAMENTAÇÃO

Preliminares

O pedido da defesa do acusado Otávio Oliva, ao final da audiência de instrução, de perícia no aparelho celular lphone XR apreendido no interior do veículo (para ter acesso a eventuais mensagens trocadas na data dos fatos) não comporta deferimento. Isso porque não se trata de uma diligência complementar cuja ‘necessidade tenha se originado de circunstâncias ou fatos apurados na instrução’ (art. 402 do CPP). Ao contrário; o aparelho celular foi apreendido já quando do flagrante, ao início da persecução penal, e assim permanece até hoje. Se a defesa pretendia a sua perícia, deveria ter se manifestado oportunamente (em especial na resposta à acusação - art. 396-A) e não só ao final da instrução. Justamente porque as provas produzidas em audiência não referiram sobre o celular, nem traduziram necessidade superveniente quanto à perícia no aparelho. Por outro lado (como ponderou o Ministério Público, quando diz não ser medida necessária), a ciência a eventuais mensagens trocadas na data dos fatos parece não ser relevante para o desfecho do processo, baseado em inúmeras outras provas e elementos informativos.

A alegação de nulidade da ação penal desde a prisão em flagrante, apresentada pela defesa de Alex Alisson, em razão de terem sido mantidas as algemas na ocasião do ato processual, não merece trânsito. A uma porque deveria ter sido trazida no momento oportuno (após o flagrante, em especial na audiência de custódia), não admitindo a jurisprudência a chamada ‘nulidade de algibeira’; a duas porquanto eventuais vícios do flagrante ou mesmo da investigação, de regra, não atingem a respectiva ação penal, dada a natureza completamente diversa dos procedimentos (um de caráter administrativo, outro jurisdicional). Por outro lado, nos termos da Súmula Vinculante nº 11/STF, eventual nulidade seria “do ato processual a que se refere”, sem repercussões, portanto, para além do flagrante ou da audiência de custódia, nas oportunidades de uso das algemas.

A defesa de Jean Jardel, por sua vez, pleiteou a nulidade do processo em decorrência da abertura de vista das respostas à acusação ao Ministério Público, sem lhe ser deferido o direito de novo pronunciamento. Não é o caso. Embora o rito ordinário não preveja a réplica do Ministério Público, no procedimento especial do júri (art. 409 do CPP) existe essa previsão, que pode ser aplicada analogicamente; do mesmo modo que no processo civil (arts. 350 e 351 do CPC), diante do qual a analogia tem previsão expressa (art. 3º do CPP); ainda mais em procedimentos como este, em que as defesas juntaram documentos (como, por exemplo, atestado médico aportado pela defesa confirmando a precária saúde de Otávio Oliva) e apresentam preliminares, em caso complexo. Não houve desequilíbrio processual ou violação à paridade armas, apenas implementação do contraditório, em situação na qual a parte acusatória não inovou em nada a imputação inicial, apenas teve garantido o seu direito de se manifestar sobre teses e fatos do processo, antes de eventual acolhimento pelo juízo. Em arremate, mesmo que se considere uma impropriedade a vista conferida, seria mera irregularidade segundo entendimento do Superior Tribunal de Justiça.

Não procede também a nulidade apontada pela defesa de Otávio Oliva, em decorrência de perguntas feitas diretamente pelo magistrado; primeiro porque a lei faculta ao juiz, inclusive de modo direto, a complementação da inquirição das testemunhas, nos termos do parágrafo único do art. 212 do CPP; segundo porque as perguntas feitas são absolutamente supletivas, restringindo-se a esclarecer o significado de siglas inúmeras vezes indicadas no processo (“PGC” e “PCC”), pelas partes e testemunhas. Legítimo exercício, portanto, como de lei reconhecido, do poder supletivo do juiz na gestão das provas do processo, sem substituir a atuação probatória do órgão da acusação (art. 3º-A do CPP).

Finalmente (em relação às preliminares erigidas nos memorias das defesas), não merece vingar eventual nulidade por uso de sacolas plásticas de supermercado no transporte das armas apreendidas quando do flagrante. Não obstante a coleta e o acondicionamento merecessem uma maior atenção e cuidado por parte dos agentes (até para atender ao que estabelecem os incisos IV e V do art. 158-B e arts. 158-C e D do CPP), fato é que o Estado não tem fornecido materiais adequados para essa finalidade aos policiais e em nenhum momento se questiona sobre a autenticidade ou se cogita de possível troca ou adulteração das armas apreendidas. Ao contrário, foram elas submetidas a perícia cujos laudos atestaram sua eficiência e funcionalidade. Destaco, ainda, que eventual quebra da cadeia de custódia teria ocorrido na fase inquisitorial e não teve qualquer reflexo na instrução criminal, sendo só agora erigida. Em arremate, lembre-se que a lei não tem previsão expressa sobre a consequência da quebra da cadeia de custódia e o STJ tem precedente no sentido de que eventuais irregularidades (como é o caso) não caracterizam ilicitude ou nulidade e devem ser sopesadas com todos os elementos produzidos na instrução (break on the chain of custody), a fim de se verificar se a prova é confiável (HC 653.515-RJ, Rel. Min. Laurita Vaz, Rel. Acd. Min. Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, por maioria, julgado em 23/11/2021). É o que aqui se está fazendo, para efeito de reconhecer que simples transporte das armas em sacolas plásticas (único recipiente que os policiais dispunham) em nada interferiu na constatação perito-oficial ou mesmo gerou dúvidas sobre a autenticidade da prova.

Mérito

Identificada a complexidade do caso, para melhor compreensão da fundamentação, cada crime será tratado de forma separada, avaliando-se a participação dos acusados em cada uma das infrações penais imputadas, iniciando-se pela organização criminosa, justamente para já deixar claro sobre o vínculo dos envolvidos, determinante que foi para a caracterização do concurso de agentes nos demais crimes praticados, como se verá. Diante do caráter coletivo de algumas imputações, materialidade e autoria serão analisadas conjuntamente.

Organização criminosa

Partindo-se do conceito legal de organização criminosa, constante do § 1º do art. 1º da Lei 12.850/13, não há dúvida de que os três acusados faziam parte da facção denominada ‘PGC’ (Primeiro Grupo Catarinense) que, como exige a lei, era composta por vários outros integrantes. Só na empreitada criminosa apurada neste processo havia quatro elementos diretamente envolvidos, caso se considere a evidente participação do adolescente (Tito Tobias, 17 anos) que, por ser inimputável, não faz parte desta relação processual.

As investigações revelaram que, ao menos no decorrer do ano de 2021, e com maior incidência nas Comarcas de Tubarão/SC, Capivari de Baixo/SC, Laguna/SC e Jaguaruna/SC, Alex Alisson, Jean Jardel, Otávio Oliva e Tito Tobias integraram a organização criminosa PGC, também com atuação em todo território catarinense, composta de centenas de membros, com ordenada estrutura e divisão de tarefas, fato este público e notório, com objetivo principal de obter vantagem pecuniária mediante a reiterada prática dos crimes de tráfico de drogas, homicídio, sequestro, roubo com emprego de arma e outros delitos patrimoniais (infrações penais cujas penas máximas são superiores a 4 anos, como exige a lei), bem como possuindo verdadeiro sistema organizado de distribuição de artefatos bélicos entre os membros do grupo.

Consta um relatório técnico operacional da Polícia Militar (acompanhado de levantamento fotográfico) confirmando que o PGC constitui organização complexa e ramificada pelo Estado, com modelo de hierarquia piramidal de comando e subordinação, composta por "disciplinas" e "sintonias" - os quais possuem poder restrito a determinada abrangência territorial -, enquanto o topo da pirâmide é integrado por membros do primeiro ministério e segundo ministério, concentrando a maior parte do poder.

Segundo a testemunha Alberto Alves (policial militar), “o setor de inteligência da Polícia Militar apurou que, em uma residência, na cidade de Capivari de Baixo/Se, elementos da organização criminosa PGC se reuniam periodicamente”. Mais que isso, os conduzidos, com a exceção de Otávio Oliva, chegaram a confirmar que eram faccionados do PGC; não obstante a negativa de um deles, a agência de inteligência tem informação de que todos os detidos são integrantes do PGC.

A existência da organização criminosa é demonstrada, inclusive, pelo motivo da empreitada criminosa (suposta alteração das siglas da facção desenhadas numa mesa de sinuca) e pela forma de atuação da trupe. Nesse sentido, a testemunha Eber Elias (policial militar), além de referendar as informações do colega (antes citadas), destacou que, segundo a vítima, os indivíduos faziam contato pelo celular e pediam autorização para assassiná-lo; usavam expressões 'era tudo dois' e 'é o trem', falas típicas utilizadas pelo PGC.

A vítima relata que, enquanto estava por eles subjugada, os elementos confidenciaram o motivo da atuação: pensaram que era do PCC (facção rival); nas chamadas de vídeo que realizavam, perante outros integrantes mais graduados da organização criminosa, que realizaram um verdadeiro tribunal de execução (perceba-se a estrutura ordenada e a divisão de tarefas) ouvia: “aqui é tudo dois, que é o trem, PGC”.

Por mais que os três, quando interrogados em juízo, tenham negado integrarem organização criminosa, reconhecem que se conheciam e estavam juntos quando da prisão em flagrante, todos no mesmo carro, justamente aquele usado na empreitada criminosa. Detalhe importante e que merece ser destacado mais uma vez, é que quando capturados, para os policiais, informalmente, os conduzidos, com a exceção de Otávio Oliva, chegaram a confirmar que eram faccionados do PGC. Enfim, existem provas acima de qualquer dúvida razoável não só da existência da organização criminosa, como também da participação de cada um dos três réus.

Tortura mediante sequestro

Houve privação de liberdade da vítima mediante sequestro ou cárcere privado; muitas provas e elementos de informação demostram isso, além do fato de que quando foram presos em flagrante, a vítima, por eles subjugada, recém tinha se jogado do carro em movimento, tamanho o seu desespero.

As informações iniciais que desencadearam as diligências policiais (e que ao fim se confirmam), já eram no sentido de que membros da facção criminosa PGC (Primeiro Grupo Catarinense) haviam capturado e pretendiam assassinar um indivíduo, supostamente integrante de facção rival PCC (Primeiro Comando da Capital), fato que teria ocorrido nas proximidades da BR-101.

Tanto a vítima estava com sua liberdade tolhida que os policiais relatam que, quando avistaram o veículo, havia um indivíduo no banco traseiro fazendo gestos assemelhados a pedido por socorro, este que, na sequência, conseguiu abrir a porta e se atirou ao solo com o carro em movimento. Existe declaração médica com relação ao estado de saúde de Américo Augusto, revelando lesões compatíveis com a queda de veículo em circulação.

O sequestro contou com a involuntária e alheia participação de Tania Tobias, mãe do adolescente envolvido que, a pedido dele e sem ciência das pretensões do quarteto, foi ‘garota de recado’ de uma falsa justificativa para encontro entre o ofendido e seus algozes (conversa sobre venda de motocicleta). Segundo as diligências realizadas, Américo Augusto foi arrebatado por Alex Alisson e Jean Jardel no banco traseiro, enquanto Tito Tobias seguia o caminho indicado por Otávio Oliva, dando-se início à privação da liberdade. A vítima teve os pés e as mãos amarradas e permaneceu subjugada por aproximadamente 4h (das 8h da manhã até meio-dia).

Diga-se de passagem: só não houve a execução da vítima diante da eficiente intervenção policial, na medida em que a ordem para tanto já estava dada; neste ponto não se cogitou de tentativa de homicídio somente porque os atos executórios (considerando o disposto no art. 121 do CP) não tinham se iniciado.

A versão da vítima sobre a privação da liberdade a que foi submetida foi declinada inicial e informalmente já aos policiais militares que atenderem a ocorrência. O relato da vítima a Eber Elias foi de que entrou no veículo e já foi privado de sua liberdade, sendo levado, depois, a local próximo ao CTG Preto Velho; lá teria sido amarrado e mantido em cárcere.

Em juízo a vítima esclareceu que foi convidada a dar uma volta de carro; após entrar no veículo Uno, com Alex Alisson e Jean Jardel no banco traseiro, enquanto Tito Tobias e Otávio Oliva nos bancos dianteiros, passou a desconfiar do que estava ocorrendo; no interior do carro, guiado por Tito Tobias e Otávio Oliva ao lado, foi agredido por Alex Alisson e Jean Jardel, perdendo sua liberdade.

Enfim, a restrição praticamente total da liberdade da vítima, por um tempo considerável, é evidente. Não obstante, o crime em questão não se caracteriza pelo tipo penal constante do art. 148 do Código Penal, mas sim pela Lei 9.455/97, como uma majorante do crime principal; qual seja, a tortura. Isso porque o crime de sequestro do Código Penal é de caráter subsidiário e só vai ocorrer quando a privação da liberdade não funcionar como meio de execução de outro crime.

Aqui, neste caso em concreto, conforme restou claro pela instrução, a vítima desde o início teve a sua liberdade tolhida com o objetivo inicial da tortura, crime mais grave, previsto em lei especial e que tem no sequestro uma causa especial de aumento de pena (inc. III, § 4º, art. 1º da Lei 9.455/97).

Dito isso, a instrução criminal também demonstrou que Américo Augusto foi submetido a verdadeiro martírio, tanto físico quanto psicológico. Segundo o que se apurou na persecução penal, inicialmente enganada e ingressando voluntariamente num veículo, a vítima começou a ser agredida e foi levada até as proximidades do CTG Preto Velho, na Comarca de Laguna/SC. Nesse local, atrás de um muro alto que divide a estrada com a propriedade, identificaram-se como membros do PGC, passando a torturar Américo Augusto mediante emprego de violência e grave ameaça, visando a obtenção da confissão de que ele fazia parte da facção rival - PCC. Dando continuidade ao intento criminoso, Alex Alisson, Jean Jardel e Tito Tobias amarraram os pés e as mãos de Américo Augusto, agredindo-o com socos, tapas no rosto e chutes. Também procederam à gravação de um vídeo incontinenti enviado aos seus superiores (facção PGC), com a intenção de receberem autorização para executar Américo Augusto. Praticaram martírio psicológico, apontando as armas de fogo que manuseavam, deixando sempre nítida a intenção de que ele seria assassinado.

Embora a declaração médica com relação ao estado de saúde de Américo Augusto, tenha revelado apenas lesões compatíveis com a queda de veículo em movimento (o que por si já denota o desespero de quem estava sendo torturado), o flagelo pelo qual passou é evidente, inclusive a nível psicológico (que não deixa vestígios - art. 158-A, § 3º do CPP), com a realização, dentre outros, de um julgamento ao vivo e virtual por tribunal do crime. A versão que a vítima apresentou sobre os fatos e suplícios é a mesma, desde o começo; seja em relatos informais e imediatos, desde o seu resgate, seja em juízo, quando pontuou: “[...] no interior do carro, guiado por Tito Tobias e Otávio Oliva ao lado, foi agredido por Alex Alisson e Jean Jardel [...]; ao chegar, tempo depois, perto do CTG Preto Velho, foi levado para atrás de um muro, amarrado e agredido com tapas, socos e chutes; [...] sentiu-se muito ameaçado, especialmente por Alex Alisson e Jean Jardel, que tinham consigo armas de fogo, as quais eram apontadas em sua direção; [...] Otávio Oliva segurava um celular que era utilizado para gravar e também fazer uma reunião, acreditando que várias pessoas apareceram no vídeo; ouvia: 'aqui é tudo dois, que é o trem, PGC' e 'é sal, é sal'; [...] na hora em que o colocaram dentro do carro imaginou mesmo que seria executado”. É possível imaginar a angústia e o sofrimento pelo qual passou...

Sem maiores digressões, superado também o standard probatório necessário para a condenação dos três acusados (sempre juntos e mancomunados) em relação ao crime de tortura mediante sequestro.

Porte ilegal de arma de fogo de uso restrito

Os três acusados também incorreram no crime de porte ilegal de arma de fogo de uso restrito. A demonstra a materialidade, consta auto de exibição e apreensão das armas de fogo apreendidas na ocasião: revólver RT 454, calibre .454 Casull, da marca Taurus e pistola semiautomática Desert Eagle, calibre .50 Action Express, ambos municiados, os quais foram posteriormente periciados e tiveram a eficiência atestadas. Além disso, termo de exibição e apreensão de dois coletes balísticos e um fuzil AK, calibre 5.56mm, com vinte e oito munições do mesmo calibre, apreendidos no porta-malas do veículo Uno, com laudos periciais atestando a eficiência e funcionalidade.

No ato da captura apreenderam-se duas armas de fogo com Alex Alisson e Jean Jardel; também se encontrou coletes, um fuzil e munição no bagageiro do Uno. Desde o começo, quando resgatada, a vítima dizia ter sido ameaçada com armas de fogo. Quando ouvida em juízo, esclareceu “que quando pegaram a corda no bagageiro pode ver a existência de arma de grosso calibre e mais munições no porta-malas; estava visível e dava fácil acesso até pelo interior do automóvel porque não se tinha a tampa do porta-malas; sentiu-se muito ameaçado, especialmente por Alex Alisson e Jean Jardel, que tinham consigo armas de fogo, as quais eram apontadas em sua direção”.

Ou seja: embora armas curtas fossem portadas por apenas dois dos acusados (Alex e Jean), as armas todas estavam disponíveis e acessíveis a todos do grupo, inclusive Otávio Oliva, tanto que o fuzil se encontrava no porta-malas, sem tampa, viabilizando fácil acesso a todos os ocupantes do veículo. Aliás, como se verá oportunamente, as armas estavam com Alex e Jean por provável determinação e aquiescência do líder do Grupo, justamente Otávio Oliva.

Em contexto fático uno, por mais que houvesse várias armas e munições, devem os agentes responder por um único crime de porte ilegal de arma de fogo. Mais que isso, todas as armas eram de uso restrito, de acordo com as normativas vigentes à época e atualmente, no caso, o Decreto 11.615/2023 e a Portaria Conjunta - C EX/DG-PF Nº 2, de 6 de novembro de 2023.

Destaque-se que o reconhecimento dessa infração penal não implica bis in idem em relação à causa de aumento da organização criminosa ‘armada’ (art. 2º, § 2º da Lei 12.850/13). São crimes com desígnios autônomos e o porte ilegal de arma não é elementar ou indispensável para a caracterização da organização criminosa (AgRg no HC n. 576.294/SC, relator Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, julgado em 25/8/2020).

Em outras palavras: a prática do crime de porte ilegal de arma de fogo pelos acusados não é delito meio ou etapa necessária para a configuração da referida majorante, pois esta diz respeito ao modus operandi da organização criminosa como um todo e não toma em conta as condutas individuais de cada um de seus integrantes (os crimes específicos). Uma coisa é se organizar para cometer crimes de forma estruturalmente ordenada; outra é, de fato, praticar os crimes, devendo cada agente responder autonomamente por cada qual. Enfim, não é caso de absorção ou consunção do porte ilegal de arma.

Tanto é assim que o preceito secundário do art. 2º, caput da Lei 12.850/13 estabelece a pena da organização criminosa, “sem prejuízo das penas correspondentes às demais infrações penais praticadas”.

Corrupção de menor

Os três acusados praticaram vários crimes com a participação e efetiva colaboração do adolescente Tito Tobias, com dezessete anos de idade na data dos fatos, nascido em 12/10/2004, conforme documentação de identificação civil e certidão de nascimento. A propósito, foi com o auxílio dele e de sua mãe que conseguiram inicialmente enganar a vítima para que entrasse voluntariamente no carro.

Crime formal, de perigo presumido, nos termos da Súmula 500 do STJ, caraterizados os demais crimes com a participação do adolescente, não há necessidade de avaliar outras circunstâncias para a configuração da corrupção de menor (art. 244-B da Lei 8.069/90).

Entregar ou permitir a direção de veículo automotor a pessoa não habilitada

Além de todos os crimes já delineados, praticados conjuntamente pelos três réus, Otávio Oliva ainda incorreu num crime de trânsito; qual seja, aquele previsto no art. 310 da Lei 9.503/97 (CTB). O carro utilizado pelo grupo era deste acusado e nesse sentido aponta a consulta consolidada (Detran/SC), com a cadeia dominial do veículo Fiat Uno, placas AOM 3444. Segundo a versão uníssona que se apresentou, o adolescente sempre esteve na condução do veículo (evidentemente sem habilitação para tanto), com Otávio sentado ao seu lado, no banco do passageiro, dando as orientações e ordens para onde deveria se dirigir. Quando abordados pelos policiais, como declinou Eber Elias, era o adolescente quem guiava o veículo. Segundo a vítima, era o menino quem dirigia o veículo e Otávio Oliva quem indicava o caminho, líder em relação aos mais jovens.

O próprio acusado Otávio Oliva confirma, em seu interrogatório judicial, que ‘emprestou o carro a Tito Tobias’.

Diante desse contexto – em que no mínimo Otávio Oliva ‘permitiu’ a direção do seu carro ao adolescente –, independentemente de ter havido algum acidente ou perigo concreto de dano, configurado está o crime de trânsito, nos termos da Súmula 575 do Superior Tribunal de Justiça.

DISPOSITIVO

Diante do exposto e observada a fundamentação subsequente da dosimetria, julgo procedente a pretensão punitiva constante da denúncia para o efeito de condenar:

ALEX ALISSON por

organização criminosa armada, com participação de adolescentes e com conexões - art. 2º, §§ 2º e 4º, I e IV da Lei 12.850/13;

tortura mediante sequestro - art. 1º, I, ‘a’ c/c § 4º, III da Lei 9.455/97;

porte ilegal de arma de fogo de uso restrito - art. 16 da Lei 10.826/03;

corrupção de menor - art. 244-B da Lei 8.069/90.

JEAN JARDEL por

organização criminosa armada, com participação de adolescentes e com conexões - art. 2º, §§ 2º e 4º, I e IV da Lei 12.850/13;

tortura mediante sequestro - art. 1º, I, ‘a’ c/c § 4º, III da Lei 9.455/97;

porte ilegal de arma de fogo de uso restrito - art. 16 da Lei 10.826/03;

corrupção de menor - art. 244-B da Lei 8.069/90.

OTÁVIO OLIVA por

organização criminosa armada, mediante comando, com participação de adolescentes e conexões - art. 2º, §§ 2º, 3º e 4º, I e IV da Lei 12.850/13;

tortura mediante sequestro - art. 1º, I, ‘a’ c/c § 4º, III da Lei 9.455/97;

porte ilegal de arma de fogo de uso restrito - art. 16 da Lei 10.826/03;

corrupção de menor - art. 244-B da Lei 8.069/90;

crime de trânsito, consistente em entregar ou permitir a direção de veículo automotor a pessoa não habilitada - art. 310 da Lei 9.503/97.

DOSIMETRIA

ALEX ALISSON

Organização criminosa armada, com participação de adolescentes e conexões

A individualização da pena tem como primeira fase a análise das circunstâncias judiciais previstas no art. 59 do Código Penal.

i. Culpabilidade: exacerbada. A organização era complexa e composta por centenas de membros, com atuação ramificada em todo o território catarinense, com modelo de hierarquia piramidal de comando e subordinação e voltada à prática de crimes extremamente graves e com “altíssima periculosidade” (conforme registrado pelo relatório técnico operacional da Polícia Militar).

ii. Conduta social: estava cumprindo pena em regime aberto na Comarca de Jaguaruna/SC, benefício que havia obtido dez dias antes do flagrante; valoração negativa pois fica evidenciada a falta de esforço para adequar sua conduta ao bom convívio em sociedade, bem como a ausência de comprometimento com o sistema de justiça e com a finalidade de ressocialização da pena anteriormente aplicada.

iii. Personalidade: nada a destacar.

iv. Motivos: comuns para a espécie e normalmente relacionados à ganância.

v. Circunstâncias: sem relevância.

vi. Consequências: nada que se possa objetivamente apurar.

vii. Comportamento da vítima: não se cogita.

viii. Antecedentes: observada a Súmula 241/STJ, excluindo as condenações definitivas, responde a processos em curso pelos delitos de furto qualificado e tráfico de drogas na Comarca de Tubarão/SC, o que não pode ser considerado em seu desfavor, nos termos da Súmula 444 do STJ.

Ponderadas as referidas circunstâncias judiciais (2 vetores negativos), estabeleço a pena-base em reclusão de 4 anos.

Passando para a segunda etapa de aplicação da pena, sem olvidar a Súmula nº 231 do STJ, destaco:

i) agravantes (arts. 61 e 62, CP): foi condenado por sentença penal transitada em julgado pelo crime de roubo; cumpriu pena pelo crime de porte ilegal de arma de fogo na Comarca de Jaguaruna/SC, cuja punibilidade foi extinta em 7-10-2020; ou seja, Alex é duplamente reincidente (art. 63 do CP) segundo o que se apresentou na folha de antecedentes criminais e serve como parâmetro (Súmula 636/STJ).

ii) atenuantes (arts. 65 e 66, CP): confissão extrajudicial, perante os policiais militares, usada na fundamentação (Súmula 545/STJ c/c REsp 1.972.098-SC).

Considerando que a confissão foi somente informal e que existe multirreincidência, preponderá esta, em consonância com o Tema 585/STJ; a pena será aumentada, fixando-se provisoriamente em 4 anos e 6 meses de reclusão.

Causas de diminuição de pena: não ocorrem.

Causas de aumento de pena: incidem três (3), aquelas dos §§ 2º e 4º, inc. I e IV do art. 2º da Lei 12.850/13; ou seja: emprego de arma, participação de adolescente e conexão com outras organizações criminosas independentes. Além do efetivo e material emprego de armas na empreitada criminosa em questão (como se reconheceu na fundamentação), a organização tinha como praxe o uso de armamento e a conexão com outras facções. Nesse sentido, o Delegado de Polícia Danilo Duarte narrou na etapa judicial, ratificando o relatório apresentado, que: "comanda algumas investigações na região de Tubarão/SC, Capivari de Baixo/SC, laguna/SC e Jaguaruna/SC; nessas investigações, apurou-se que o PGC possui ligação com outras duas facções criminosas, a 'Família do Norte' - FDN (que comanda o crime no Amazonas e domina a cobiçada Rota Solimões, sendo uma das maiores produtoras de cocaína do mundo) e o 'Comando Vermelho' - CV (oriundo do Rio de Janeiro). Os próprios líderes do PGC admitiram a proximidade e conexão com tais facções e que a intenção é sempre buscar melhorar a estrutura existente; a negociação com as organizações criminosas compreende a troca de apoio dos aliados, incluindo o envolvimento com drogas e armamento bélico, além da necessidade de reconquistar os lugares ocupados pelo PCC e montagem de equipe para evitar a retomada do território por parte deste. Por outro lado, o relatório técnico operacional da Polícia Militar reconheceu que se trata de grupo “fortemente armado” e com “constante participação de adolescentes”. Sobre a última circunstância, importante perceber que Tito Tobias (adolescente) admitiu informalmente fazer parte da facção.

Nos termos do parágrafo único do art. 68 do CP e considerando que essa disposição, segundo a jurisprudência, se aplica também a causas previstas na legislação extravagante (como é o caso), a pena será aumentada de 2/3 (maior fração), redundando numa pena definitiva de 7 anos e 6 meses de reclusão.

Tortura mediante sequestro.

Na primeira fase e quanto às circunstâncias judiciais, faço remissão ao que já estabelecido para o crime de organização criminosa. Aqui também, a exemplo da conduta social, a culpabilidade é exacerbada porquanto o martírio da vítima foi bastante grande, com amarração, várias agressões e perdurou por horas e locais diferentes. As circunstâncias merecem reprovação; houve verdadeiro julgamento informal por ‘tribunal do crime’ com ordem de execução (tormento psicológico) que aparentemente só não aconteceu pela eficiente intervenção da polícia. Os motivos são banais para tanta crueldade e merecem reprovação – restringem-se ao fato de a vítima ter apagado sigla de facção criminosa em mesa de sinuca para escrever outra, segundo ela, para simplesmente ‘zoar’ e sem que integrasse qualquer grupo.

Ponderadas as referidas circunstâncias judiciais (4 pejorativas), estabeleço a pena-base em reclusão de 3 anos e 6 meses de reclusão.

Passando para a segunda etapa de aplicação da pena, destaco:

i) agravantes (arts. 61 e 62, CP): Alex é duplamente reincidente segundo o que se apresentou na folha de antecedentes criminais (Súmula 636/STJ) e já foi destacado anteriormente.

ii) atenuantes (arts. 65 e 66, CP): não ocorrem.

Considerando a reincidência, fixo a pena provisoriamente em 4 anos de reclusão.

Causas de diminuição de pena: não ocorrem.

Causas de aumento de pena: incide aquela prevista no inc. III do § 4º do art. 1º da Lei 9.455/97; de tal maneira que a pena será aumentada de 1/6, redundando, definitivamente, em 4 anos e 8 meses de reclusão.

Porte ilegal de arma de fogo de uso restrito.

Na primeira fase e quanto às circunstâncias judiciais, faço remissão ao que já estabelecido para o crime de organização criminosa. Aqui também, a exemplo da conduta social, a culpabilidade é exacerbada porquanto havia três armas de fogo de uso restrito, curtas e longa (um fuzil), além de coletes balísticos.

Ponderadas as referidas circunstâncias judiciais (2 pejorativas), estabeleço a pena-base em reclusão de 4 anos de reclusão e 13 dias-multa.

i) agravantes (arts. 61 e 62, CP): Alex é duplamente reincidente, específico no caso de porte de arma, segundo o que se apresentou na folha de antecedentes criminais (Súmula 636/STJ) e já foi destacado anteriormente.

ii) atenuantes (arts. 65 e 66, CP): não ocorrem.

Considerando a reincidência e a natureza do crime anterior (porte de arma), fixo a pena em 4 anos e 8 meses de reclusão e 15 dias-multa, que se torna definitiva à falta de outras causas de aumento ou diminuição de pena.

Corrupção de menor.

Na primeira fase e quanto às circunstâncias judiciais, faço remissão ao que já consignado para o crime de organização criminosa. Aqui também a culpabilidade é exacerbada porquanto foram vários os crimes praticados com a participação muito efetiva do adolescente, necessária desde o começo da empreitada criminosa até para induzir a vítima a encontrar voluntariamente com seus algozes.

Ponderadas as referidas circunstâncias judiciais (2 pejorativas), estabeleço a pena-base em reclusão de 1 ano e 4 meses de reclusão.

Passando para a segunda etapa de aplicação da pena, destaco:

i) agravantes (arts. 61 e 62, CP): Alex é duplamente reincidente segundo o que se apresentou na folha de antecedentes criminais (Súmula 636/STJ) e já foi destacado anteriormente.

ii) atenuantes (arts. 65 e 66, CP): não ocorrem.

Considerando a reincidência, fixo a pena provisoriamente em 1 ano e 6 meses de reclusão.

Na terceira etapa de fixação da pena, incide ainda a causa de aumento prevista no § 2º do art. 244-B da Lei 8.069/90 (ECA). Algumas infrações cometidas com o adolescente estão incluídas no rol de crimes hediondos (organização criminosa direcionada à prática de crimes hediondo) ou são equiparadas a crime hediondo (tortura). A pena será aumentada de 1/3, ficando definitivamente estabelecida em 2 anos de reclusão.

Considerando a natureza e a objetividade distintas dos crimes, com o consequente concurso material (benéfico em relação à corrupção de menores - art. 69 c/c o parágrafo único do art. 70 do CP), somadas/unificadas as penas do condenado Alex Alisson, o total de pena privativa de liberdade resulta em 18 anos e 10 meses de reclusão e 15 dias-multa.

O valor do dia-multa, tendo como referência a condição econômica demonstrada pelo acusado, é arbitrado em um trigésimo (1/30) do maior salário-mínimo mensal vigente ao tempo do fato (art. 49, § 1º, CP).

O regime inicial de cumprimento de pena será o fechado, considerando o total de pena privativa de liberdade (art. 33, § 2º, ‘a’, CP), as circunstâncias judiciais pejorativas (§ 3º, art. 59, CP) e a reincidência, além do disposto no § 7º, art. 2º da Lei 9.455/97 e § 1º, art. 2º da Lei 8.072/90. Inviável, evidentemente, a substituição ou a suspensão da pena (arts. 44 e 77 do CP), diante da quantidade estabelecida, do emprego de violência e grave ameaça e da reincidência em crime doloso.

JEAN JARDEL

Organização criminosa armada e com participação de adolescentes.

i. Culpabilidade: exacerbada, nos exatos termos em que destacado para o corréu Alex Alisson.

ii. Conduta social: nada que o desabone.

iii. Personalidade: nada a destacar.

iv. Motivos: comuns para a espécie e normalmente relacionados à ganância.

v. Circunstâncias: sem relevância.

vi. Consequências: nada que se possa objetivamente apurar.

vii. Comportamento da vítima: não contribuiu para a infração.

viii. Antecedentes: responde à ação penal pelo crime de tráfico de drogas e porte ilegal de arma de fogo de uso restrito na Comarca de Capivari de Baixo/SC, sendo beneficiado com a liberdade provisória em 02-8-2021, o que não pode ser considerado em seu desfavor, diante da presunção de inocência e nos termos da Súmula 444 do STJ.

Ponderadas as referidas circunstâncias judiciais (1 vetor negativo), estabeleço a pena-base em reclusão de 3 anos e 6 meses.

Passando para a segunda etapa de aplicação da pena, sem olvidar a Súmula nº 231 do STJ, destaco:

i) agravantes (arts. 61 e 62, CP): não se verificam.

ii) atenuantes (arts. 65 e 66, CP): menoridade relativa (nascido em 24/11/2001, conforme documentação de identificação civil e certidão de nascimento, com 19 anos de idade à época do fato) e confissão extrajudicial perante os policiais militares, usada na fundamentação (Súmula 545/STJ c/c REsp 1.972.098-SC).

Considerando as duas atenuantes e a Súmula 231 do STJ, a pena retorna ao mínimo legal, fixando-se provisoriamente em 3 anos de reclusão.

Causas de diminuição de pena: não ocorrem.

Causas de aumento de pena: por brevidade e economia processual, aqui se faz remissão, por completo, ao que já destacado anteriormente na terceira fase de aplicação da pena do corréu Alex Alisson. Do mesmo modo, para Jean Jardel a pena será aumentada de 2/3 (maior fração), redundando numa pena definitiva de 5 anos de reclusão.

Tortura mediante sequestro.

Na primeira fase e quanto às circunstâncias judiciais, faço remissão ao que já estabelecido para o crime de organização criminosa. Aqui também a culpabilidade é exacerbada porquanto o martírio da vítima foi bastante grande, com amarração, várias agressões e perdurou por horas e locais diferentes. As circunstâncias merecem reprovação; houve verdadeiro julgamento informal por ‘tribunal do crime’ com ordem de execução (tormento psicológico) que aparentemente só não aconteceu pela eficiente intervenção da polícia. Os motivos são banais para tanta crueldade e merecem reprovação – restringem-se ao fato de a vítima ter apagado sigla de facção criminosa em mesa de sinuca para escrever outra, segundo ela, para simplesmente ‘zoar’ e sem que integrasse qualquer grupo.

Ponderadas as referidas circunstâncias judiciais (3 pejorativas), estabeleço a pena-base em reclusão de 3 anos.

Passando para a segunda etapa de aplicação da pena, destaco:

i) agravantes (arts. 61 e 62, CP): não se verificam.

ii) atenuantes (arts. 65 e 66, CP): menoridade relativa, conforme já destacado.

Considerando a atenuante, a pena retorna para 2 anos e 6 meses, fixando-se provisoriamente.

Causas de diminuição de pena: não ocorrem.

Causas de aumento de pena: incide aquela prevista no inc. III do § 4º do art. 1º da Lei 9.455/97; de tal maneira que a pena será aumentada de 1/6, redundando, definitivamente, em 2 anos e 11 meses de reclusão.

Porte ilegal de arma de fogo de uso restrito.

Na primeira fase e quanto às circunstâncias judiciais, faço remissão ao que já estabelecido para o crime de organização criminosa. Aqui também a culpabilidade é exacerbada porquanto havia três armas de fogo de uso restrito, duas curtas e uma longa (um fuzil), além de coletes balísticos.

Ponderadas as referidas circunstâncias judiciais (1 pejorativa), estabeleço a pena-base em reclusão de 3 anos e 6 meses e 12 dias-multa.

i) agravantes (arts. 61 e 62, CP): não se verificam.

ii) atenuantes (arts. 65 e 66, CP): menoridade relativa, conforme já destacado.

Considerando a atenuante e a Súmula 231/STJ, a pena retorna para reclusão de 3 anos e 10 dias-multa, que se torna definitiva à falta de causas de aumento ou diminuição de pena.

Corrupção de menor.

Na primeira fase e quanto às circunstâncias judiciais, faço remissão ao que já consignado para o crime de organização criminosa. Aqui também a culpabilidade é exacerbada porquanto foram vários os crimes praticados com a participação muito efetiva do adolescente, necessária desde o começo da empreitada criminosa até para induzir a vítima a encontrar voluntariamente com seus algozes.

Ponderadas as referidas circunstâncias judiciais (1 pejorativa), estabeleço a pena-base em reclusão de 1 ano e 2 meses de reclusão.

Passando para a segunda etapa de aplicação da pena, destaco:

i) agravantes (arts. 61 e 62, CP): não se verificam.

ii) atenuantes (arts. 65 e 66, CP): menoridade relativa, conforme já destacado.

Considerando a atenuante e a Súmula 231/STJ, a pena retorna para 1 ano de reclusão, que se torna definitiva à falta de causas de aumento ou diminuição de pena.

Na terceira etapa de fixação da pena, incide ainda a causa de aumento prevista no § 2º do art. 244-B da Lei 8.069/90 (ECA). Algumas infrações cometidas com o adolescente estão incluídas no rol de crimes hediondos (organização criminosa direcionada à prática de crimes hediondo) ou são equiparadas a crime hediondo (tortura). A pena será aumentada de 1/3, ficando definitivamente estabelecida em 1 ano e 4 meses de reclusão.

Considerando a natureza e a objetividade distintas dos crimes, com o consequente concurso material (benéfico em relação à corrupção de menores), somadas/unificadas as penas do condenado Jean Jardel, o total de pena privativa de liberdade resulta em 12 anos e 3 meses de reclusão e 10 dias-multa.

O valor do dia-multa, tendo como referência a condição econômica demonstrada pelo acusado, é arbitrado em um trigésimo (1/30) do maior salário-mínimo mensal vigente ao tempo do fato (art. 49, § 1º, CP).

O regime inicial de cumprimento de pena será o fechado, considerando o total de pena privativa de liberdade (art. 33, § 2º, ‘a’, CP) e as circunstâncias judiciais pejorativas (§ 3º, art. 59, CP), além do disposto no § 7º, art. 2º da Lei 9.455/97 e § 1º, art. 2º da Lei 8.072/90. Inviável, evidentemente, a substituição ou a suspensão da pena (arts. 44 e 77 do CP), diante da quantidade estabelecida e do emprego de violência e grave ameaça.

OTÁVIO OLIVA

Organização criminosa armada e com participação de adolescentes.

i. Culpabilidade: exacerbada, conforme destacado para os corréus.

ii. Conduta social: nada que o desabone.

iii. Personalidade: nada a destacar.

iv. Motivos: comuns para a espécie e normalmente relacionados à ganância.

v. Circunstâncias: sem relevância.

vi. Consequências: nada que se possa objetivamente apurar.

vii. Comportamento da vítima: não se cogita.

viii. Antecedentes: sem registros criminais.

Ponderadas as referidas circunstâncias judiciais (1 vetor negativo), estabeleço a pena-base em reclusão de 3 anos e 6 meses.

Passando para a segunda etapa de aplicação da pena, sem olvidar a Súmula nº 231 do STJ, destaco:

i) agravantes (arts. 61 e 62, CP): incide aquela prevista no § 3º, art. 1º da Lei 12.850/13. Segundo o relatório técnico operacional da Polícia Militar, Otávio Oliva exercia liderança na estrutura, ainda que subordinada ao comando regional e este, por consequência, à cúpula da facção. Era o dono do carro, determinava o caminho a ser tomado; segundo a vítima, segurava o celular quando do contato com outros membros externos da facção, orientava e dava todas as coordenadas para os demais agentes, bem mais jovens. O delegado Danilo Duarte também confirmou o papel de liderança por ele exercido.

ii) atenuantes (arts. 65 e 66, CP): Otávio Oliva tem mais de 70 anos nesta data (art. 65, I, CP), nascido que é em 03/10/1940, de acordo com documentação de identificação civil e certidão de nascimento.

Compensando-se a agravante com a atenuante a pena provisória permanece em 3 anos e 6 meses de reclusão.

Causas de diminuição de pena: não ocorrem.

Causas de aumento de pena: por brevidade e economia processual, aqui se faz remissão, por completo, ao que já destacado anteriormente na terceira fase de aplicação da pena do corréu Alex Alisson. Do mesmo modo, para Otávio Oliva a pena será aumentada de 2/3 (maior fração), redundando numa pena definitiva de 5 anos e 10 meses de reclusão.

Tortura mediante sequestro.

Na primeira fase e quanto às circunstâncias judiciais, faço remissão ao que já estabelecido para o crime de organização criminosa. Aqui também a culpabilidade é exacerbada porquanto o martírio da vítima foi bastante grande, com amarração, várias agressões e perdurou por horas e locais diferentes. As circunstâncias merecem reprovação; houve verdadeiro julgamento informal por ‘tribunal do crime’ com ordem de execução (tormento psicológico) que aparentemente só não aconteceu pela eficiente intervenção da polícia. Os motivos são banais para tanta crueldade e merecem reprovação; restringem-se ao fato de a vítima ter apagado sigla de facção criminosa em mesa de sinuca para escrever outra, segundo ela, para simplesmente ‘zoar’ e sem que integrasse qualquer grupo.

Ponderadas as referidas circunstâncias judiciais (3 pejorativas), estabeleço a pena-base em reclusão de 3 anos.

Passando para a segunda etapa de aplicação da pena, destaco:

i) agravantes (arts. 61 e 62, CP): conforme motivos já explanados em relação a outro crime, Otávio Oliva, bem mais velho, dirigia a atividade dos demais agentes (art. 62, I, CP);

ii) atenuantes (arts. 65 e 66, CP): Otávio Oliva tem mais de 70 anos nesta data (art. 65, I, CP), nascido que é em 03/10/1940, de acordo com documentação de identificação civil e certidão de nascimento.

Compensando-se a agravante com a atenuante a pena provisória permanece em 3 anos de reclusão.

Causas de diminuição de pena: não ocorrem.

Causas de aumento de pena: incide aquela prevista no inc. III do § 4º do art. 1º da Lei 9.455/97 (sequestro); de tal maneira que a pena será aumentada de 1/6, redundando, definitivamente, em 3 anos e 6 meses de reclusão.

Porte ilegal de arma de fogo de uso restrito.

Na primeira fase e quanto às circunstâncias judiciais, faço remissão ao que já estabelecido para o crime de organização criminosa. Aqui também a culpabilidade é exacerbada porquanto havia três armas de fogo de uso restrito, duas curtas e uma longa (um fuzil), além de coletes balísticos.

Ponderadas as referidas circunstâncias judiciais (1 pejorativa), estabeleço a pena-base em reclusão de 3 anos e 6 meses e 12 dias-multa.

i) agravantes (arts. 61 e 62, CP): conforme motivos já explanados em relação a outro crime, Otávio Oliva, bem mais velho, dirigia a atividade dos demais agentes (art. 62, I, CP);

ii) atenuantes (arts. 65 e 66, CP): Otávio Oliva tem mais de 70 anos nesta data (art. 65, I, CP), nascido que é em 03/10/1940, de acordo com documentação de identificação civil e certidão de nascimento.

Compensando-se a agravante com a atenuante a pena provisória permanece em 3 anos e 6 meses de reclusão e 12 dias-multa, restando definitiva à falta de causas de aumento ou diminuição de pena.

Corrupção de menor.

Na primeira fase e quanto às circunstâncias judiciais, faço remissão ao que já consignado para o crime de organização criminosa. Aqui também a culpabilidade é exacerbada porquanto foram vários os crimes praticados com a participação muito efetiva do adolescente, necessária desde o começo da empreitada criminosa até para induzir a vítima a encontrar voluntariamente com seus algozes.

Ponderadas as referidas circunstâncias judiciais (1 pejorativa), estabeleço a pena-base em reclusão de 1 ano e 2 meses de reclusão.

Passando para a segunda etapa de aplicação da pena, destaco:

i) agravantes (arts. 61 e 62, CP): conforme motivos já explanados em relação a outro crime, Otávio Oliva, bem mais velho, dirigia a atividade dos demais agentes (art. 62, I, CP);

ii) atenuantes (arts. 65 e 66, CP): Otávio Oliva tem mais de 70 anos nesta data (art. 65, I, CP), nascido que é em 03/10/1940, de acordo com documentação de identificação civil e certidão de nascimento.

Compensando-se a agravante com a atenuante a pena provisória permanece em 1 ano e 2 meses de reclusão.

Na terceira etapa de fixação da pena, incide ainda a causa de aumento prevista no § 2º do art. 244-B da Lei 8.069/90 (ECA). Algumas infrações cometidas com o adolescente estão incluídas no rol de crimes hediondos (organização criminosa direcionada à prática de crimes hediondo) ou são equiparadas a crime hediondo (tortura). A pena será aumentada de 1/3, ficando definitivamente estabelecida em 1 ano, 6 meses e 20 dias de reclusão.

Entregar ou permitir a direção de veículo automotor a pessoa não habilitada.

Na primeira fase e quanto às circunstâncias judiciais (observado o § 4º do art. 291 do CTB), faço remissão ao que já consignado para o crime de organização criminosa. Aqui também a culpabilidade é exacerbada porquanto a direção do veículo foi entregue não só a alguém não habilitado, como também a alguém muito jovem, ainda adolescente, colocando em risco potencial maior a segurança viária.

Ponderadas as referidas circunstâncias judiciais (1 pejorativa), estabeleço a pena-base em detenção de 7 meses.

Passando para a segunda etapa de aplicação da pena, destaco:

i) agravantes (arts. 61 e 62, CP): conforme motivos já explanados em relação a outro crime, Otávio Oliva, bem mais velho, dirigia a atividade dos demais agentes (art. 62, I, CP), inclusive na direção do veículo automotor;

ii) atenuantes (arts. 65 e 66, CP): Otávio Oliva tem mais de 70 anos nesta data (art. 65, I, CP), nascido que é em 03/10/1940, de acordo com documentação de identificação civil e certidão de nascimento. Por outro lado, acabou por confessar o crime em juízo, ao admitir que ‘emprestou o carro’, informação inclusive usada na fundamentação.

A pena retorna ao seu mínimo legal – 6 meses de detenção, que se torna definitiva à falta de causas de aumento e diminuição de pena. Nesse ponto, justifico que a pena de multa (alternativa para esta infração penal), isoladamente, não seria suficiente para prevenção e reprovação do crime, considerando a gravidade do fato (entrega da direção de veículo para adolescente numa verdadeira empreitada criminosa) e o concurso com vários outros crimes sujeitos a pena privativa de liberdade de longa duração.

Nos termos dos arts. 292 e 293 do CTB, tendo em conta sua idade avançada, suspendo a habilitação do condenado para dirigir veículo automotor pelo prazo mínimo de 2 meses, penalidade que não se inicia enquanto o sentenciado, por efeito desta condenação, estiver recolhido a estabelecimento prisional (§ 2º).

Considerando a natureza e objetividade distintas dos crimes, com o consequente concurso material (benéfico em relação à corrupção de menores), somadas/unificadas as penas do condenado Otávio Oliva, o total de pena privativa de liberdade resulta em 14 anos, 4 meses e 20 dias de reclusão; 6 meses de detenção e 12 dias-multa.

O valor do dia-multa, tendo como referência a condição econômica demonstrada pelo acusado, é arbitrado em um trigésimo (1/30) do maior salário-mínimo mensal vigente ao tempo do fato (art. 49, § 1º, CP).

O regime inicial de cumprimento de pena será o fechado, considerando o total de pena privativa de liberdade (art. 33, § 2º, ‘a’, CP) e as circunstâncias judiciais pejorativas (§ 3º, art. 59, CP), além do disposto no § 7º, art. 2º da Lei 9.455/97 e § 1º, art. 2º da Lei 8.072/90. Inviável, evidentemente, a substituição ou a suspensão da pena (arts. 44 e 77 do CP), diante da quantidade estabelecida e do emprego de violência e grave ameaça.

DISPOSIÇÕES FINAIS

Nos termos do art. 804 do Código de Processo Penal, condeno os três acusados ao pagamento das custas processuais (‘pro rata’).

A prisão é necessária e existe grande perigo na liberdade dos condenados. Os acusados responderam todo o processo presos e assim deverão permanecer (art. 387, § 1º do CPP c/c o § 3º, art. 2º da Lei 8.072/90). Isso porque praticaram crimes hediondos, integrando organização criminosa estruturada, armada e perigosíssima, conforme reconhecido nesta sentença, restando presentes ainda e com mais razão, os mesmos motivos (a que se faz remissão) erigidos para a conversão do flagrante em prisão preventiva (dentre eles garantia da ordem pública – art. 312 do CPP pela gravidade das infrações e recorrência dos agentes).

O tempo de prisão provisória, nos termos do § 2º do art. 387 do CPP, por mais que compensado, em nada altera o regime inicial de cumprimento de pena (fechado).

Observado o art. 91, I do CP, deixo de fixar reparação mínima dos danos causados (art. 387, inciso IV do CPP), considerando a inexistência de pedido expresso e indicação de valor na denúncia para essa finalidade, conforme entendimento do STJ (REsp n. 1.986.672/SC, relator Ministro Ribeiro Dantas, Terceira Seção, julgado em 8/11/2023).

Comunique-se a vítima encaminhando cópia desta sentença, nos termos do art. 201, § 2º do CPP.

Bens apreendidos: verifique a Secretaria se as armas apreendidas, contantes do auto de exibição e apreensão, já foram encaminhadas ao Comando do Exército para destruição ou doação, nos termos do art. 25 da Lei 10.826/03; o veículo apreendido, considerando que não se trata de bem ilícito sujeito a perdimento (art. 91, II, ‘a’ do CP), poderá ser devolvido ao seu possuidor Otávio Oliva, ou a alguém por ele expressamente autorizado; do mesmo modo se proceda em relação ao aparelho celular Iphone XR.

Transitada em julgado esta sentença:

a) expeça(m)-se guia(s) de recolhimento/execução, atentando-se para as normativas internas deste Tribunal;

b) comunique-se a Justiça Eleitoral, diante do contido na Constituição Federal (artigo 15, inciso III);

c) com relação à pena de multa (art. 50 do CP e art. 686 do CPP) e às custas processuais, proceda-se à liquidação e cobrança;

d) intime-se Otávio Oliva para entregar, em 48h, a sua carteira de habilitação, conforme disposto no § 1º do art. 293 da Lei 9.503/97; comunicando-se ao Conselho Nacional de Trânsito - CONTRAN, e ao órgão de trânsito do Estado em que ele for domiciliado ou residente (art. 295);

e) cumpram-se as demais disposições pertinentes contidas no Código de Normas da Corregedoria-Geral da Justiça, especialmente atentando para as devidas comunicações;

f) oportunamente, arquive-se.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.